sexta-feira, junho 01, 2007

Sem Ressentimentos

Eu pretendia, lá para agosto, prestar um concurso público para jornalista da Câmara dos Deputados. Concursos para jornalistas raramente surgem porque, quase sempre, essa maldita profissão entra na cota dos cargos de confiança. Nada mais justo. Se você tem um cargo importante na administração pública e pretende contratar um jornalista, é bom que ele seja de sua inteira confiança. Senão já viu.
Quando os poucos concursos para jornalistas aparecem, geralmente, são oferecidas pouquíssimas vagas. Uma ou duas. Às vezes, inclusive, não existe nenhuma vaga disponível e eles abrem um concurso para o chamado cadastro de reserva. Cadastro de reserva é o banco de reservas da administração pública. Você fica lá, com cara de bosta, esperando que alguém resolva te colocar em campo. No caso do jornalismo, em que e rotatividade é muito lenta, estar no cadastro de reserva seria o mesmo que ser goleiro reserva do Gilmar dos Santos Neves (desculpa, Vivi, depois eu te explico quem é esse cara).
Eis que, no início do ano, surge esse edital fantástico e maravilhoso: concurso público para trabalhar na Câmara dos Deputados, com vagas pra todos os gostos, inclusive para técnico em energia nuclear, motorista de vespa, dançarina profissional de rumba e jornalista. O mais incrível é que eram oferecidas oito vagas para jornalistas só de imprensa escrita. Havia mais cinco pra rádio e quatro pra TV, sei lá, coisa assim.
Oito vagas para ganhar um salário de 9 mil reais? Algum desavisado poderia dizer: impossível. Imagina a concorrência dessa porra. Pois é, a coisa tá braba e as pessoas costumam se estapear por salários muito mais modestos. Agora, 9 mil reais? Eu nem saberia o que fazer com essa fortuna. Não é gozação. Eu acho muito dinheiro mesmo. E quem não acha vá à puta que o pariu antes que eu me esqueça. Pois é, meu caro desavisado: oito vagas para jornalista é uma coisa incrível. É raríssimo. Pode perguntar aos concurseiros profissionais, aqueles que escarafuncham semanalmente a Folha Dirigida e o Jornal dos Concursos. Eles dirão que eu não estou mentindo.
Decidi, então, prestar esse concurso, apesar da inscrição ser uma bica (R$ 123,00) e de eu não ter a menorzíssima vontade de morar em Brasília. Mas com a Vivi eu moro até na Lapônia, ainda mais ganhando um salário desses. Vambora, pensei. Fiz a inscrição, peguei o programa de matérias e comecei a estudar. Nesses estudos, eu li coisas muito boas. Destaque para a "História da imprensa no Brasil", do Nelson Werneck Sodré. Com ele eu descobri que o Período Regencial foi muito quente par a imprensa brasileira, uma época em que surgiram pasquins e periódicos escritos por gente bastante contestadora como Líbero Badaró e Frei Caneca (que não são apenas nomes de ruas.
Destaque, também para o livro "Sobre ética e imprensa", do Eugênio Bucci, que eu tinha fazia tempo, mas, vergonhosamente, não havia aberto. Inclusive, o Bucci lançou esse livro numa livraria muito simpática que existia na Vila Madalena, lá na rua Fradique Coutinho. Eu também tive que aprender semiótica, porque na faculdade eu achava aquilo um saco e, em vez de assistir às memoráveis aulas da motoqueira Sônia Régis, eu ia para o Doca's. Acho que eu nunca havia me empenhado tanto na vida. Até o regimento interno da Câmara dos Deputados eu li e, pela primeira vez, eu comprei um livro de direito: "Lei da Imprensa comentada". Não vou nem dizer quanto custou, mas foi outra bica, vocês podem ter certeza.
Até que esse período de estudos foi divertido. Eu ficava lá, na biblioteca da PUC, lendo e caçando uns livros que poderiam ser úteis. Eu até achei um livro chamado "A miséria do jornalismo brasileiro", do Juremir Machado da Silva, que não me ajudaria em nada no concurso, mas me rendeu uma leitura muito prazerosa. O Juremir faz uma análise muito ácida e bem humorada do jornalismo que é praticado no Brasil atualmente, através de pequenos ensaios com cara de crônica que me renderam boas risadas. Destaque para as coisas que ele fala do Jô Soares e do Chico Buarque enquanto escritor. Outro dia eu volto a esse assunto, que merece um comentário à parte.
Como dizem que, hoje em dia, até sonhar está difícil, aconteceu um fato um tanto desagradável. A Fundação Carlos Chagas, organizadora do concurso, informou no site que o concurso da Câmara dos Deputados estava suspenso para reformulações no edital. Depois de pouco mais de um mês, foram publicadas as tais reformulações e, dentre elas, adivinhem?, estava um corte no número de vagas para jornalistas da imprensa escrita: de oito para UMA MÍSERA VAGA.
Primeiro eu pensei: me fodi. Depois eu pensei: vão se foder. Talvez eu tenha primeiro pensado: vão se foder, depois que eu me fodi e, finalmente, vão se foder de novo. Fui claro? Foda, não? Pelo menos havia a possibilidade para alguns prejudicados, como nós jornalistas, de pegar os R$ 123 de volta. Conversei com a Vivi sobre essa possibilidade e ela disse, depois de refletir um pouco: "É, acho que o melhor é pedir a restituição desse dinheiro à Fundação Carlos Chagas, sem ressentimentos". Isso mesmo. Sem ressentimentos e sem ódio no coração, com todo respeito à FCC, que não tem nada a ver com o número de vagas oferecidas nos concursos, pedi meus 123 reais de volta.
Ontem, no meu horário de almoço, eu fui a uma agência do Itaú, armado com a cartinha da FCC, meu RG e meu CPF. Confesso que eu estava um pouco preocupado, porque esse negócio de devolução de dinheiro, para mim, sempre foi meio obscuro. Mas não. A mulher do caixa que me atendeu disse: "Nossa, que coincidência. Eu acabei de devolver o valor de uma inscrição para concurso a uma moça" É? Ótimo. Rapidamente, eu estava com os meus R$ 122,50 - cinqüenta centavos foram para uma dessas tantas taxas administrativas.
Obrigado por devolver o meu dinheiro, FCC. Sem ressentimentos.

quinta-feira, maio 31, 2007

Tartaruga

Eu não tenho muito tempo por isso eu preciso ser rápido então eu vou escrevendo sem saber exatamente o que escrever é isso mesmo você não leu errado e por incrível que pareça gerealmente eu penso muito antes de escrever peno tanto que a coisa fica uma merda pior que encomenda mas eu estou perdendo tempo e não queria dizer nada disso eu precisava dizer que o nome do mala é Hudson e não Rúdson e isso me faz pensar que o mala fica ainda mais mala sendo Hudson e não Rúdson e ainda por cima deve ser...não que eu tenha alguma coisa contra como dizia Jerry Seinfeld mas as linhas vão passando na velocidade de uma Ferrari guiada pelo Rubinho Pé de Chinelo porque eu sou o maior catador de milho mas eu ainda não disse tudo que eu precisava dizer eu precisava dizer também que eu fui com a Vivi ontem ao aniversário do Rodrigo na pizzaria Babbo Giovanni e me desculpem porque eu não sei escrever o nome dessa porra eu devo ter escrito errado mas fodam-se todos que se atentarem para tal fato e eu queria muito experimentar a tal pizza de camarão à baiana mas era uma bica então nós ficamos nas tradicionais mesmo e também eu quero dizer que o Rodrigo sobreviveu às sacanagens do mala Hudson e hoje eu tomei uma sopa maravilhosa no natureba do Viaduto 9 de Julho e era uma sopa de cenoura com gengibre uma verdadeira delícia e depois um bêbado louco quis andar pela mureta do viaduto e eu falei com o policial que disse que já tinha gente indo pra lá e muito obrigado cidadão e acabou o meu tempo porque a Vivi chegou pra me buscar e ela não pode ficar lá em baixo esperando e se tiver erro de digitação foda-se porque tá tudo errado mesmo e eu acabei de assassinar o vernáculo e um beijo e eu amo todos vocês tchau.

quarta-feira, maio 30, 2007

O Mala

Outro dia, Vivi me contou sobre um tal de Rúdson (ou seria Hudson?), funcionário do Colégio Arquidiocesano, onde ela fez ginásio e colegial. No Arqui, como os estudantes carinhosamente chamam o colégio (na verdade, é muito difícil falar Ar-qui-di-o-ce-sa-no), como todo bom colégio marista, era obrigatório o uso de uniforme. Mas, como a Igreja Católica vem se modernizando, o uniforme consistia em qualquer calça, desde que fosse azul-marinho (tolerava-se calça jeans) e a camiseta do colégio, que tinha uma golinha de padre, própria pra que ficasse visível mesmo debaixo de alguma blusa de frio. O Rúdson era encarregado de garantir que todos os alunos cumprissem essa regra fundamental para o funcionamento daquele templo do saber. Caso alguém ousasse comparecer sem o devido uniforme, Rúdson era implacável. Ele caçava os infratores com seus olhos de lince, os reunia em sua sala e, finalmente, os despachava de volta para casa, devidamente advertidos.
Eis que Vivi, um belo dia de frio (como hoje), chega ao Arqui propriamente agasalhada e, impropriamente, sem a tal camiseta com gola de padre. Rúdson, o mala, já estava diante da entrada do colégio, colhendo os menores infratores e, quando avistou Vivi, perguntou: Uniforme, doutora? (sim, o mala chamava a todos de doutor e doutora, dependendo do gênero da pessoa em questão). Vivi tentou não perder o rebolado e ainda deu aquela conferida falsa, como se não soubesse que estava, DE PROPÓSITO, sem a camiseta do Arqui e sua charmosa golinha de padre. Ao ouvir um: "Ih, esqueci...", como resposta, Rúdson amealhou nossa querida infratora e juntou-a ao grupo de delinqüentes, desrespeitadores de regras, que, provavelmente, devem estar hoje por aí, saqueando supermercados, roubando bancos e trocando tiros com a polícia.
Diante daquela fila indiana de pobres coitados, tratados como prisioneiros que seriam obrigados a remar nas galeras para todo o sempre (só não estavam acorrentados, é bom esclarecer), Vivi se aproveitou de um descuido de Rúdson - coisa que raríssimas vezes acontecia - e fugiu da fila. Sabendo que ninguém, jamais, em toda a história do Arquidiocesano, havia escapado com vida do implacável Rúdson, Vivi, esbaforida, pediu socorro ao seu amigo Rodrigo, que também tinha a ficha bem suja, mas, naquele dia, estava devidamente uniformizado. No melhor estilo: "Por favor, não me peça explicações", Vivi pediu para que Rodrigo lhe cedesse sua camiseta. Rodrigo, que é um gentleman, o fez. E lá foram os dois para a sala de aula.
Não demorou muito para que Rúdson, com seu ar sádico e seu quase-sorriso sarcástico, aparecesse à porta da sala de Vivi, sedento por vingança. Nada escapava aos olhos desse GRANDESSÍSSIMO MALA. Por isso, Rúdson abordou a "doutora fujona" que, cheia de confiança, e na maior cara-de-pau (quem diria, dona Viviane?), disse: "Eu não fugi. Eu apenas me lembrei que estava com a camiseta dentro da minha mochila e fui ao banheiro me trocar". Pode-se dizer que, por dois segundos, Rúdson chegou a ficar desconcertado e, quase, quase mesmo, deixou escapar sua enorme frustração por não poder torturar nossa doce heroína por duas horas antes de mandá-la para casa (sem deixar marcas, porque o cara era profissional).
O problema é que, quando o mala é mala, e só um mala de verdade é contratado pra fazer esse tipo de coisa nas escolas, nada passa despercebido por sua mente diabólica, carregada de frustrações que tal figura faz questão de descontar nas alegres crianças e adolescentes que ele não conseguiu ser... desculpem, eu acho que me descontrolei. Enfim, Rúdson, que não deixa nada escapar, direcionou sua fúria ao pobre Rodrigo, que estava sentado ao lado de Vivi (que amadorismo, hein?). Rúdson, rapidamente, percebeu que Rodrigo não estava com a charmosa golinha de padre à mostra. Rodrigo, de acordo com a minuciosa descrição de Vivi, era a indignação estampada. De tão indignado, ficou mudo, atônito, imóvel e, a única reação que conseguiu esboçar foi um olhar de esguelha, olhar este que transmitia toda a sua condição de ser mais injustiçado da face da Terra, em direção a Vivi. Vivi também ficou sem reação e, apenas, tentou esboçar um ar de "Rodrigo, me perdoa!".
Não houve tempo para nada além de esboços de reação. Rúdson, o mala, já estava afiando sua foice ao lado de sua gôndola, que levaria Rodrigo para o Vale da Morte. Mas, como eu já disse, mala é mala, e poucos conseguiram atingir o grau de malice (ou seria malismo?) que Rúdson, o rei, atingia com o pé nas costas, todas as manhãs. Quando tudo parecia resolvido, Rúdson notou que Vivi estava vestindo um calça preta, portanto, fora dos padrões exigidos pelos grandes educadores para que se atinja o conhecimento puro. Sem esboçar a menor piedade, Rúdson levou os dois cúmplices para a "sala de massagens" e, em seguida, foram ambos despachados, devidamente advertidos, para casa.
Esta triste história é verdadeira, da primeira à última linha. Hoje, Rodrigo completa 26 anos. Parabéns, Rodrigo. Onde quer que você esteja, pode ter certeza que você mora no coração de todos os alunos do Arqui. Onde quer que você esteja, saiba que, um dia, Rúdson pagará por tudo que fez. Onde quer que você esteja, estaremos também, eu e Vivi, hoje à noite, para devorar uma pizza e falar mal de Rúdson, o mala.

terça-feira, maio 29, 2007

Alcances do Fanatismo

Estava um calor de rachar, como em todos os dias do ano. O ar estava úmido, como em todos os dias do ano. O que diferenciava o dia 13 de setembro de 1975, em Boa Vista, Roraima, de todos os outros dias do ano, era um evento que mudaria a história da vida de 9.980 pessoas. Elas foram testemunhas oculares de um acontecimento que jamais se repetirá: a inauguração do estádio 13 de Setembro, mais conhecido como Canarinho, que abrigou uma rodada dupla. No jogo inaugural, Baré 2 X 0 Roraima, o jogador Reis entrou para os anais da história como o primeiro a estufar as redes (oficialmente) do estádio Canarinho. A atração principal, que todos esperavam ansiosamente, era o clássico que colocaria à prova a enorme rivalidade existente entre roraimenses e acreanos: São Raimundo-RR e Rio Branco mediriam forças diante das 9.980 supracitadas pessoas.
O jogo foi muito disputado. Logo nos primeiros minutos, o lateral-direito do São Raimundo, chamemos o rapaz de Zeca, impulsionado pelos gritos da torcida, arrancou pela direita (naturalmente), venceu os 110 metros de comprimento do estádio, parou na linha-de-fundo, olhou bem e chutou em direção à área adversária. A bola flutuou, venceu os 75 metros de largura do estádio e saiu, sem oferecer perigo à meta do goleiro... chamemos o rapaz de Mendonção. Mesmo assim, a torcida ovacionou entusiasticamente a disposição do jogador Zeca.
Era o dia de Mendonção. O arqueiro do Rio Branco, para a frustração de todos os presentes, menos os vinte e seis heróis que venceram a distância entre Rio Branco e Boa Vista para apoiar seu time, diante daquele tremendo desafio. E a desagradável viagem, dentro de um ônibus apertado e, depois, dentro de um barco mais apertado ainda, valeu a pena. Não só Mendonção realizou uma partida quase impecável (não fossem três tiros de meta que ele mandou direto pra fora e mais uns cinco chutes que ele bateu roupa), como o trio de ataque riobranquense, comandado pelo maestro Mourinha, resolvera estragar a festa dos anfitriões. Graças a esse ataque infernal, o jogo terminou 2 a 0 para os visitantes (como deveria anunciar o placar, mas o encarregado se recusou a realizar tal feito), provocando o retorno ao lar de 9.954 (9.980 menos os torcedores do Rio Branco) cabisbaixos cidadãos.
Essa singela e preconceituosa historieta é fruto da imaginação de um paulistano que tinha dificuldade de lembrar o nome da capital de Roraima e não sabia bem onde era o Acre, inspirado por um site genial que o Lino achou durante uma de suas pesquisas. O site se chama Templos do Futebol e tem fotos e informações de tudo que é estádio do Brasil. Só da cidade de São Paulo, além dos tradicionais Pacaembu; Morumbi; Parque Antarctica; Alfredo Schuring, ou Parque São Jorge, carinhosamente conhecido como Fazendinha; Rua Javari (Juventus); e Comendador de Souza (Nacional), os caras listam a existência do glorioso Ícaro de Castro Melo, no Ibirapuera e onde o Corinthians já bateu o Fluminense em jogo válido pelo Campeonato Brasileiro, do qual eu havia me esquecido completamente.
A lista cita outros, como o estádio da USP e um tal Estádio do Trabalhador, no Tatuapé. Mas o bacana é que eles também citam estádios que não existem mais, como o Velódromo Paulistano (que tinha espaço pra futebol e foi demolido em 1916); e o estádio do Clube Athletico Paulistano, nos Jardins, que tinha espaço para 15 mil pessoas e foi demolido em 1950. Por aí vai, meu povo.
Os malucos também fundaram a SOCOPE - Sociedade dos Colecionadores de Postais de Estádios. Eu fico impressionado com o alcance que tem o fanatismo por esse esporte bretão, ou italiano, ou chinês, ou maia (eles usavam a cabeça dos inimigos para depois curtir uma pelada), ou zanzibarica, ou sei lá onde uns e outros dizem que nasceu o futebol

Crise de Identidade

Depois que eu decidi voltar a fazer exercícios físicos - e o único jeito de tornar isso possível foi passando a acordar às seis da manhã - eu fiz duas redescobertas fantásticas: a primeira é que o dia tem mesmo 24 horas. Não é uma lenda urbana - ou melhor, rural. A segunda é que dormir à noite é muito interessante. Parece que a pessoa descansa. Quem faz tempo que não experimenta ir deitar umas dez, tente. Eu recomendo. Mas com moderação.

Essa recomendação, porém, está gerando um conflito muito sério com a minha própria natureza de escrevinhadeiro insone. Sim, porque, é fato que, antes de me tornar um escrevinhadeiro, eu já tive dias melhores. A começar pelo fato de que, dos meus sete anos de idade até os meus dezoito, eu estudei de manhã, o que me obrigava a acordar cedo de segunda a sexta-feira. Nas férias que eu passava na fazenda do meu tio, nas redondezas de Dourados, era necessário acordar lá pelas cinco da matina se eu quisesse tomar leite tirado diretamente da vaca. Das cinco e meia em diante, sobravam só as vacas um tanto derrubadas e o leite não era igual ao das vacas vigorosas. Pode perguntar pra qualquer sommelier de leite (lactólogo?) e ele dirá que eu não estou mentindo.
Quem diria?, pergunta Esfeluntis, o escrevinhadeiro insone já foi um madrugador? Calma, minha gente. Que fique bem claro que, aos fins de semana, eu não saía da cama antes do meio-dia nem fudendo (só pra mijar, ou vomitar, essas coisas...); que fique bem claro que, esses negócios de tomar leite da Estrela, da Pitanga, ou da Baleia, às cinco da manhã, fazia parte da curtição de um paulistano típico que passava o ano escutando o canto do canário Volkswagen e o relincho do Corcel, como diz Renato Teixeira.
Nunca fui madrugador, mas pode-se dizer que eu já cavalguei muitas vezes pelas pradarias sul-matogrossenses, montado no Petiço, ao lado dos meus companheiros Mané e Chumbão; já pesquei muito dourado, pintado, surubim, mandi e jiripoca nas águas cristalinas (agora nem tanto) do Rio Brilhante, a bordo do bote do meu tio Osmar Gileno (que bebia cachaça num vidrinho de catchup etti); já nadei (e quase me afoguei) muitas vezes no Rio São Domingos, comi fruta no pé, cacei muita galinha que depois a minha tia Air (pronuncia-se "Aír", hein?, por favor) preparava ao molho pardo no fogão a lenha; matei muita sucuri no braço; seduzi muitas camponesas estonteantes que depois foram fazer propaganda de leite de aveia Davene...
Não há dúvidas: meu lado urbano sufocou esse pequeno fazendeiro que existia em mim. Não sobrou nada desse pobre coitado, além de uma foto dele, montado no Petiço, ao lado do tio, que está pregada no mural da minha sala. Tenho saudade dele, mas, fazer o quê? Tá mortinho e enterrado. O problema é que está querendo vir à tona esse lado que quer aproveitar o dia e dormir à noite, talvez levemente influenciado pelo ruralismo que já me habitara. Isso pode compremeter seriamente o escrevinhadeiro que existe dentro de mim.
Alguém tem um bom psicanalista pra me indicar?


segunda-feira, maio 28, 2007

Pena de Morte

Àqueles que cagam e não dão descarga,
Àqueles que jogam chiclete no mictório,
Àqueles que conversam dentro do cinema,
Àqueles que correm pelo acostamento,
Àqueles que prejudicam o Timão,
Àqueles que acreditaram no Renan Calheiros,
Àqueles que ainda votarão no Serra,
Àqueles que ainda acreditam no governo Lula,
Àqueles que fazem a barba todos os dias, invariavelmente,
Àqueles que obrigam os outros a escutar Adriana Calcanhoto depois do almoço,
Àqueles que obrigam os outros a escutar os Tribalistas antes, durante ou depois do almoço,
Àqueles que mandaram cartas de condolências à Folha pela morte do 'publisher' Frias,
Àqueles que gostam do chato do Pasquale Cipro Neto,
Àqueles que ainda assistem ao Programa do Jô,
Àqueles que ainda assistem às novelas do Manoel Carlos,
Àqueles que foram ao casamento da Wanessa Camargo,
Àqueles que te levam ao Skol Beats,
Aos patrulheiros ideológicos,
Aos cagadores de regras:
Sou pela extinção voluntária da raça humana.
Dá uma lida que é engraçado: www.vhemt.org

Escola do Riso

Depois de falar do regente japonês, é hora de falar de um filme japonês: "Escola do riso", que a Vivi e eu fomos assistir ontem no Cine Sesc. É bom adiantar que ambos gostamos muito, mas, como somos meio chatos, ficamos um tempão comentando sobre os defeitos da obra. Ora, descer o pau em "Cidade proibida", do Andy Garcia, ou em "Rocky Balboa", com o vovô Stalone, é muito sem graça. Agora, discutir o porquê de um bom filme como "Escola do riso" não ter conseguido ser um puta filme - porque tinha potencial para tanto -, isso sim é divertido.

Meu blógui é nonsense e eu dou pitaco em tudo? Sim, eu estou pronto pra trabalhar na Polícia Federal. Já tenho até uma sugestão para o nome da próxima operação: Metralhadora Giratória; ou, Merda no Ventilador. Não vou entrar em detalhes profundos da minha discussão com a Vivi sobre o filme japonês, porque eu acho que vale a pena assistir e eu não sou muito bom em falar do filme sem estragar a história. Então, direi, apenas, que a idéia do filme é genial (tinha mesmo potencial para ser um puta filme): a relação de um censor, no Japão pré Segunda Guerra, com um autor de comédia que tenta ter sua peça aprovada. O filme poderia ser só isso. Mas não é, e aqui começam as chatices do casal cricri.

Primeiro ponto: trilha sonora. Em alguns momentos, é um desastre. Chega a estragar a cena. Foda, mas só não foi pior que tocar "I can't take my eyes off you" no filme italiano "Crocodilo". Pisada feia, sô. Segundo ponto (e eu prometo que paro por aqui): fiquei com a impressão que o filme é feito para nós, estúpidos ocidentais viciados em filmes norte-americanos pouco sutis. Em alguns momentos, o filme explica demais, e a poesia vai pro espaço. Uma pena.
Digo que é uma pena porque o filme é bom. Insisto nessa questão. Se fosse uma merda, eu ia querer que se fodesse. Enfim, saí um pouco desapontado, com a sensação que, dali, poderia ter saído um filme excelente. Bom, já falei disso, já ficou claro e chega de tautologia.
Uma pena mesmo foi ter sentado perto de um cara muito desagradável. Um tipo que eu odeio esbarrar nos cinemas da vida, mais que esses adolescentes que ficam zoando (mesmo porque eles não vão se atrever a assistir a um filme que não seja norte-americano), é o tipo sabichão, aquele que quer mostrar que é esperto. Havia um desses atrás de nós, que ficava tentando adivinhar o andamento da história. É foda. Mas, ignoremos esse merda. Ele não estará no cinema (espero) quando os meus milhares de leitores forem ao Cine Sesc.
Só mais uma coisa: os personagens são propositalmente estereotipados. Mesmo assim, eu acho que, em alguns momentos, até o estereótipo fica exagerado.