sexta-feira, novembro 07, 2008

Cassandra fala de Obama

O mundo está eufórico.
Todos celebram a vitória de Obama, e a primeira coisa que dizem é que ele é o primeiro negro a ser eleito presidente do país mais poderoso do mundo. Um negro no mais alto posto do planeta seria, portanto, algo de fenomenal.
Ora, quem sou eu para minimizar esse feito histórico? Bom, eu sou um chato, intrometido, e gosto de falar sobre o que não entendo. Afinal, dizem os autos que eu sou jornalista. Então vamos lá: não fiquei feliz pela vitória de Obama?
Sinceramente, não muito. Explico. Fiquei mais satisfeito por não ter ganhado o McCain, que mais parecia um Bush piorado. Se é que isso é possível.
E por quê?
Ora, porque ninguém chega à presidência dos EUA por acaso.
Passada a euforia, é certo que o Obama vai desapontar muita gente, porque ele não vai acabar com o embargo a Cuba, ele não vai cortar o subsídio aos agricultores americanos, ele não vai deixar de alimentar a indústria bélica (ainda mais em um momento de recessão como este), ele não vai equilibrar o gigantesco auxílio econômico que os EUA dão a Israel, enquanto tantos palestinos morrem de fome, enfim, ele não vai deixar de fazer o que qualquer presidente americano faria, assim como Clinton, que também era outro presidente pop, não foi capaz nem de assinar o tratado de Kyoto. Obama não fará nada muito diferente, porque cabe a ele sustentar os EUA no topo, e, para isso, é necessário dançar conforme a música.
Certo, mas e o fato de ele ser negro? Não é uma vitória? Claro que sim. Fico feliz por um negro ter alcançado a presidência de uma república dominada por uma elite branca. Mas, não posso deixar de lembrar a análise que meu pai fez quando o Lula foi eleito presidente pela primeira vez. Ele disse: os brasileiros não queriam o Lula, mas eles queriam menos ainda o continuísmo do governo FHC. Guardadas as devidas proporções, eu acho que essa análise serve para as eleições nos EUA.
Muitos norte-americanos não queriam o Obama, mas eles tinham repulsa à idéia de prolongar a era Bush. Por que eu digo isso? Porque, apesar de a popularidade de Bush filho estar em um nível baixíssimo, cerca de 30% (tanto que o McCain, a exemplo do Serra em 2002, se esforçou muito para descolar a sua imagem do atual governo), e, apesar de ter estourado uma crise econômica seriíssima nos EUA (e no mundo), a vitória de Obama, apesar de folgada em número de delegados, não foi tão folgada assim em número absoluto de eleitores.
O que eu quero dizer é que, se fosse em um outro momento, a elite branca americana teria sérias dificuldades para votar em Obama. Tanto que muitos eleitores da Hillary debandaram para o McCain. Havia até cartazes com os dizeres: Fui Hillary, agora sou McCain.
Enfim, na minha opinião, a vitória de Obama foi importante. Mas, algo me diz que não vai demorar muito para muitos brancos que agora estão quietinhos começarem a se sentir à vontade para fazerem críticas maldosas ao novo presidente norte-americano. E não vai demorar para que muitos negros pobres ao redor do mundo comecem a dizer que Obama é um "negro de alma branca", porque, insisto, Obama não chegou lá por acaso. Ele não é um super-herói. E ele fará de tudo para que a hegemonia norte-americana perdure, em detrimento de uma melhora nas condições de vida da maioria da população mundial.
Só para concluir: provavelmente, as grandes diferenças do governo democrata de Obama serão sentidas em ações internas. E é claro que isso reflete no mundo. Mas nada mudará de substancial. Não acredito que nós teceiro-mundistas tenhamos grandes motivos para celebrar. A única ação externa mais relevante que eu acredito que Obama fará, será promover a retirada das tropas americanas do Iraque - ainda assim, com muita, mas muita cautela.