quarta-feira, setembro 08, 2010

Análise Eleitoral

Imagino um cara que entrou em coma profundo há 20 anos e agora recupera a consciência. Lá na cama do hospital, ele abre os olhos com dificuldade e percebe estar sozinho num quarto impessoal, com uma televisão suspensa ligada na propaganda eleitoral gratuita.
"Estou num hospital", conclui rapidamente o enfermo, ao tentar ajustar a altura da cama. Mas ele sente dores pelo corpo, como se estivesse deitado ali há muito tempo. O alívio vem, justamente, quando ele olha para a televisão e vê as mesmas caras de sempre.
Nada mudou, substancialmente, porque as coisas mudam muito devagar. Os candidatos são semelhantes e, os discursos, idênticos. Até o ey-ey-eymael segue religiosamente (isso não é um trocadilho) o roteiro de campanha de sempre. Lembro, criança, de já ver o sujeito com essa musiquinha irritante, a dizer, com voz solene: "Sou um democrata cristão". És, também, meu caro Eymael, um puta de um chato (que o TRE não bloqueie este blógui esvaziado).
Às vezes os candidatos mudam de cor, ou de discurso, conforme a ocasião, feito os jogadores de futebol, ora ídolos do Botafogo que vão jogar no Fluminense. É, as campanhas estão cada vez mais futebolísticas, a considerar o número de candidatos boleiros. Dava pra fazer um time dos bons (pelo menos no papel): Romário, Vampeta, Marcelinho Carioca, Túlio, até o Dinei, que ainda solta um grunhido parecido com "uá", ao terminar de dizer a frase que lhe cabe.
E as pessoas adoram dizer que no Brasil é foda, porque, tem Sérgio Mallandro? Tem, sim senhor! Tem Tiririca? Tem, sim senhor! E tem Mulher Pera, Mulher Melão, atriz pornô, projetos de comediantes e, talvez, até algum político no meio dessa balbúrdia toda.
É foda, mas esse negócio de candidatos bizarros, oportunistas que se aproveitam da fama para ganhar uma boquinha na engrenagem estatal, isso não é invenção nossa, Tem aos montes nas mais consolidadas democracias. E, lá, os esclarecidos eleitores também votam nessa turmaiada nojenta.
Fazer o quê? Noves fora, eu não sei o que será mais feio pra nós: a "peruca" da Dilma ou a careca do Serra; a cara de chuchu do Alckmin ou a cara de quem comeu um morcego cru do Mercadante. Pra não falar em outras escolhas ingratas: "Anestesia" sabor Aécio ou Hélio Costa-Quente? Tarso Genro, Fogaça ou Yeda "Cruzes!"? E por aí vai.
Eu não vou. Não vou votar em ninguém. Meu título é do DF e estarei em São Paulo, bem sossegadamente desesperado pela boa e velha falta de opções. Deem-me uma terceira via ou calem-se para sempre!

segunda-feira, setembro 06, 2010

Fim da Linha

Dei uma olhada em volta e todos pareciam indiferentes. Estávamos no mundo dos mortos. Aquela seria a nossa casa até sempre. Uma casa aconchegante, é verdade, porque cada vez mais gente chegava por ali. Teríamos que aprendera dividir o espaço, coisa que nunca aprenderíamos em vida, nem que vivêssemos milhares de anos.

Ali, não adiantaria nada matar alguém, ou sacanear, ou tentar obter vantagens. Eu tentei, assim como todos os filhos da puta que chegavam aos montes todos os dias, molhar a mão de um daqueles credenciados. Mas, molhar a mão com quê? Já dizia Vinicius de Moraes, a quem ainda não tive o imenso prazer de conhecer, que do nosso mundo só levamos o nosso paletó. O resto fica por lá, para parentes que travarão brigas horríveis para ver quem vai ficar com a sua obturação de ouro, seu autógrafo do Fittipaldi e sua jaqueta surrada de couro.

Não havia muito a ser feito. Nada , praticamente. Esperaríamos pelo fim de uma história sem fim. Intrigou-me, até, o fato de haver um relógio na parede escura daquela sala de espera. Um relógio que funcionava e tudo. Mostrava as horas de acordo com o fuso de Atenas. Nunca pensei que teria saudade de um daqueles consultórios médicos com a revista Istoé de três meses atrás e os últimos duzentos números da revista Caras.

Depois de três horas e catorze minutos, chamaram pelo meu nome. Fui atendido, exatamente, às 2h27 do horário de Atenas. Fiquei um tanto desapontado com o tal Hades. Um sujeito baixinho, atarracado, careca e, o mais estranho, simpático. Respondeu a todas as minhas perguntas cretinas com muito bom humor e não perdeu a paciência nem quando eu pedi pela oitava vez para que ele antecipasse a chegada da Camila Pitanga ao nosso mundo. Não que eu desejasse a morte da moça, mas, afinal, mesmo depois de mortos nós seres humanos continuamos a ser um tanto egoístas.

Terminado o meu tempo, ganhei um número de identificação. Agora eu era o 17.432.112.776.104.466.399.614.548-10. Teria eu que decorar aquele número? “Apenas se você quiser assinar a revista ‘Helles e Hellas’”.

(to be continued in 2013)