Professor Lima Barreto
Estou lendo um livro de contos do mestre Lima Barreto que, na minha opinião, está entre os três melhores escritores brasileiros de todos os tempos. É impressionante como ele já apresentava questões no início do século XX que, hoje, as pessoas ainda pensam que é novidade. Lima criou uma maneira de escrever ficção engajada, comprometida com as questões sociais do nosso País, sem se tornar panfletário, e a maneira como ele abusa da ironia é sensacional.
A editora Crisálida que, se não me engano, é lá de Minas, reuniu numa única edição os 58 contos publicados pelo Lima Barreto e, ainda, colocou um prefácio do João Antônio, de quem eu já falei aqui e a quem poucos conhecem. Estou dizendo isso por duas coisas: primeiro, porque muita gente só tem contato com o Lima Barreto através do Triste Fim de Policarpo Quaresma, que é um ótimo livro, mas as pessoas vão ler para o vestibular, ou porque o professor manda, e acabam não aproveitando muito. O fato é que a obra desse gênio é bem mais vasta e pouquíssimo conhecida. Ele ficou conhecido como um daqueles escritores de um livro só, mas, na verdade, está longe de ser o caso.
O segundo motivo pelo qual estou escrevendo é um prefácio assinado pelo próprio Lima Barreto, que também está na edição da Crisálida: trata-se de uma resposta a um leitor que, muito educadamente, o criticou, porque ele não fala de amor e não busca as afetações helênicas das quais tantos pseudo-escritores adoram abusar para serem classificados como eruditos. A resposta é maravilhosa. E o que mais tocou a minha alma de escrevinhadeiro foi esse trecho aqui:
"Parece-me que o nosso dever de escritores sinceros e honestos é deixar de lado todas as velhas regras, toda a disciplina exterior dos gêneros, e aproveitar de cada um deles o que puder e procurar, conforme a inspiração própria, para tentar reformar certas usanças, sugerir dúvidas, levantar julgamentos adormecidos, difundir as nossas grandes e altas emoções em face do mundo e do sofrimento dos homens, para soldar, ligar a humanidade em uma maior, em que caibam todas, pela revelação das almas individuais e do que elas têm de comum e dependente entre si".
O Lima Barreto prossegue:
"A literatura do nosso tempo vem sendo isso nas suas maiores manifestações, e possa ela realizar, pela virtude da forma, não mais a tal beleza da falecida Grécia, que já foi realizada; não mais a exaltação do amor que nunca esteve a perecer; mas a comunhão dos homens de todas as raças e classes, fazendo que todos se compreendam, na infinita dor de serem homens, e se entendam sob o açoite da vida, para maior glória e perfeição da humanidade".
Depois de ter falado de Gilliard e Jece Valadão, acho que era a minha obrigação colocar um texto sobre uma personalidade da categoria de Afonso Henriques de Lima Barreto.
Bom fim de semana a todos e a todas. Se eu tiver alguma idéia (ou saco) eu apareço por aqui.