sexta-feira, dezembro 01, 2006

Professor Lima Barreto

Estou lendo um livro de contos do mestre Lima Barreto que, na minha opinião, está entre os três melhores escritores brasileiros de todos os tempos. É impressionante como ele já apresentava questões no início do século XX que, hoje, as pessoas ainda pensam que é novidade. Lima criou uma maneira de escrever ficção engajada, comprometida com as questões sociais do nosso País, sem se tornar panfletário, e a maneira como ele abusa da ironia é sensacional.
A editora Crisálida que, se não me engano, é lá de Minas, reuniu numa única edição os 58 contos publicados pelo Lima Barreto e, ainda, colocou um prefácio do João Antônio, de quem eu já falei aqui e a quem poucos conhecem. Estou dizendo isso por duas coisas: primeiro, porque muita gente só tem contato com o Lima Barreto através do Triste Fim de Policarpo Quaresma, que é um ótimo livro, mas as pessoas vão ler para o vestibular, ou porque o professor manda, e acabam não aproveitando muito. O fato é que a obra desse gênio é bem mais vasta e pouquíssimo conhecida. Ele ficou conhecido como um daqueles escritores de um livro só, mas, na verdade, está longe de ser o caso.
O segundo motivo pelo qual estou escrevendo é um prefácio assinado pelo próprio Lima Barreto, que também está na edição da Crisálida: trata-se de uma resposta a um leitor que, muito educadamente, o criticou, porque ele não fala de amor e não busca as afetações helênicas das quais tantos pseudo-escritores adoram abusar para serem classificados como eruditos. A resposta é maravilhosa. E o que mais tocou a minha alma de escrevinhadeiro foi esse trecho aqui:
"Parece-me que o nosso dever de escritores sinceros e honestos é deixar de lado todas as velhas regras, toda a disciplina exterior dos gêneros, e aproveitar de cada um deles o que puder e procurar, conforme a inspiração própria, para tentar reformar certas usanças, sugerir dúvidas, levantar julgamentos adormecidos, difundir as nossas grandes e altas emoções em face do mundo e do sofrimento dos homens, para soldar, ligar a humanidade em uma maior, em que caibam todas, pela revelação das almas individuais e do que elas têm de comum e dependente entre si".
O Lima Barreto prossegue:
"A literatura do nosso tempo vem sendo isso nas suas maiores manifestações, e possa ela realizar, pela virtude da forma, não mais a tal beleza da falecida Grécia, que já foi realizada; não mais a exaltação do amor que nunca esteve a perecer; mas a comunhão dos homens de todas as raças e classes, fazendo que todos se compreendam, na infinita dor de serem homens, e se entendam sob o açoite da vida, para maior glória e perfeição da humanidade".
Depois de ter falado de Gilliard e Jece Valadão, acho que era a minha obrigação colocar um texto sobre uma personalidade da categoria de Afonso Henriques de Lima Barreto.
Bom fim de semana a todos e a todas. Se eu tiver alguma idéia (ou saco) eu apareço por aqui.