sexta-feira, janeiro 14, 2011

O Futuro de um Império

Há cerca de uma década, Michael Hardt e Antonio Negri lançaram o livro "Império", que discute o ciclo de vida das grandes potências da nossa História. Para os autores, a derrocada de um império é algo natural, que faz parte de um ciclo inevitável. Interpretei, ao ler esse livro quando eu estava na faculdade, que um dos principais fatores que levam o império à decadência é a arrogância. Explico: o império age com a certeza de que durará para sempre e poderá crescer infinitamente, até o momento em que essa superpotência, incapaz de sustentar seu próprio peso, começa a ruir.
Michael Hardt e Antonio Negri, ao falarem sobre os Estados Unidos, atual líder mundial, explicam que a nação norte-americana demonstra a nova maneira de agir de um império, que não tem mais a intenção de crescer geograficamente, como os ex-conquistadores Roma e Egito, ou os ex-colonizadores Espanha e Portugal. A Inglaterra, apesar de ter investido também em várias colônias, já inaugurava a tendência moderna de estender suas garras sobre o mundo através do domínio econômico, sem precisar expandir suas fronteiras.
E assim fizeram os Estados Unidos, que, ao fim da Segunda Guerra Mundial, consolidaram uma tendência que já havia iniciado no início do Século XX e se transformaram na maior potência do planeta. Não há uma nação no mundo, mesmo as grandes aliadas dos EUA, que não considera os norte-americanos arrogantes, mesmo que tal rótulo seja utilizado, muitas vezes, nos bastidores.
Ora, a arrogância é característica natural dos impérios, característica esta que, em algum momento, contribuirá para que eles caiam do cavalo. Não eram arrogantes os imperadores romanos, que se consideravam verdadeiros deuses? Ou os papas e os monarcas? Por que não seriam arrogantes os norte-americanos? E o resto do mundo, diante dos impérios, sempre nutriu por eles um sentimento que vai do respeito ao ódio e, sempre, seja o império que for a dominar o planeta, será enxergado pelos outros países com desconfiança.
Anunciava-se, então, a inevitável derrocada do império estadunidense? Sim, assim como Eric Hobsbawm e milhares de outros cientistas humanos já anunciam o ocaso da superpotência yankee há pelo menos uma década. E, a cada dia mais, surgem outros milhares de estudos e artigos a anunciar a China como o próximo principal império do planeta, com alguma chance para a Índia e, correndo por fora, Rússia e, até o Brasil. São os BRICs a avançar e a conquistar o terreno que era dos Estados Unidos no passado. Sim, a disputa de território, atualmente, é econômica, política, cultural.
É fato que o presidente dos Estados Unidos, ainda considerado, sem a menor dúvida, a pessoa que ocupa o cargo mais importante do mundo, não é mais venerado por onde passa como acontecia há alguns anos. E isso não tem nada a ver com racismo. Tem a ver com a perda de terreno econômico para outras nações. Estou falando esse monte de abobrinha porque outro dia eu tive que encarar uma sala de espera e lá estava uma revista Veja, com um bloco especial sobre a crise do domínio norte-americano sobre o mundo.
A matéria citava vários especialistas, muitos deles "da casa", ou melhor, norte-americanos, a dizer que os dias dos Estados Unidos como maior potência do planeta estão contados. Já anunciaram até o ano em que a economia chinesa passará a ser a maior: 2027. Para o Brasil, reservam o posto de quarta maior economia do mundo.
Quando eu ouço essas previsões macroeconômicas, não consigo evitar a comparação com previsões meteorológicas. A economia, ao meu ver, funciona como o clima. Pode ser prevista com uma certa precisão em prazos curtos, mas mudanças repentinas podem mudar tudo. Enfim, mesmo que esses caras estejam certos (quanto à decadência dos EUA eu não tenho muitas dúvidas), eu não consigo me animar muito, porque não vejo o Brasil tomando qualquer iniciativa duradoura para a diminuição das injustiças sociais. Os líderes políticos brasileiros agem com dois intuitos: faturar politicamente de maneira rápida e evitar que a bomba estoure em suas mãos.
Governa-se, por aqui, sem nenhuma visão de longo prazo, sem nenhuma intenção de se construir uma base social sólida e, é claro, com muito, mas muito, muitíssimo desperdício de dinheiro, de recursos, de riqueza de todas as ordens. Se o Brasil será a quarta maior economia do mundo, não vejo razão para comemorar. Vislumbro, infelizmente, o aumento do desperdício, das desigualdades, da corrupção.
Como pensar diferente se o Congresso Nacional está mais preocupado em aumentar seu próprio salário do que para elaborar reformas fundamentais, como a política, a tributária, a administrativa? Como pensar diferente se o Poder Executivo está sempre tão interessado em lotear cargos e em atuar de acordo com seus próprios interesses? Como pensar diferente se a grande mídia continua nas mãos de três ou quatro, se o Judiciário continua com uma mentalidade do Século XIX, se os grandes bandidos deste país, os de colarinho branco, não só estão à solta como possuem prestígio e, mais que isso, ocupam cargos públicos? Como ter esperança de dias melhores se o descaso, entra ano e sai ano, continua o mesmo?
É só ver essa tragédia das chuvas, que se repete sempre, sem que nenhuma medida seja tomada. O desastre chega, mata centenas, o governo federal publica uma medida provisória liberando recursos extraordinários para as regiões mais afetadas e, logo, ouve-se falar em desvio de grana em lugar de ser ver uma verdadeira reconstrução. Logo, vemos novas desgraças, novas catástrofes, novos descasos, novos insultos, novas cusparadas nas nossas caras.
Gil e Caetano estão certos: o Haiti é aqui. Com a diferença de que temos potencial para sermos a quarta maior potência do planeta.

quarta-feira, janeiro 12, 2011

Desgaste

Luciana entrava no quarto pela quinta vez nos últimos vinte minutos.
- Já assinou o papel que eu tenho que levar pro poupa-tempo?
Jéferson sorriu e, em lugar de responder, deu mais uma puxada caprichada no seu baseado. Enfim, perguntou, com aquela voz presa:
- Que papel?
Luciana se segurou para não voar no pescoço do marido e esbravejou:
- Porra, Jéferson! Eu te pedi mil vezes pra assinar a porra do papel que eu deixei em cima da cama, caralho. Eu preciso dessa merda assinada já.
O casal já havia passado por tempos melhores. Jéferson já havia sido um promissor jogador de futebol, mas uma contusão séria, quando ele ainda tinha dezenove anos, acabou comprometendo sua carreira. Por causa de uma fratura no joelho, Jéferson ficou mais de um ano longe dos gramados e, quando voltou, nunca mais jogou bem. Foi ladeira a baixo, até que, aos 29 anos, depois de ter sido dispensado do Taquaritinga, Jéferson resolveu pendurar a chuteira.
Luciana o acompanhou por todos esses anos, com muita paciência, mas não tem companheirismo que suporte tudo e para sempre. Depois que Jéferson passou a fumar maconha sem parar, Luciana trocou as palavras de carinho e incentivo por insultos e mais insultos.
- Se eu voltar aqui e você não tiver assinado a merda do papel eu vou...
- Calma, querida. Está aqui, assinado. Pode levar pro poupa-tempo.
Na saída do poupa-tempo, tocou o celular da Luciana. Era Marcela, sua irmã.
- Oi, estou saindo aqui do poupa-tempo. Você acredita que o Jéferson não assinou o papel que eu pedi pra ele assinar? Aquele filho da puta. Pior, ele assinou, mas assinou no lugar errado. Mas eu liguei pra ele e falei um monte. Eu falei: seu imbecil, você assinou no lugar errado; por causa dessa merda, eu vou ter que voltar aqui amanhã. Sabe o que ele disse? Nada. Aí eu falei que se fosse pra fumar maconha ele tinha feito a coisa direitinho. Sabe o que o idiota falou? "Eu não enxerguei direito". Aquele maconheiro do caralho. Aí eu perguntei: onde você tem o olho, no cu? Calma o caralho, Marcela. Eu não aguento mais aquele inútil em casa. Foda-se se ele não vai aguentar o meu abandono. Não quero saber. Vou foder a minha vida por causa daquele traste?
Era a milésima vez que a Luciana ameaçava deixar o marido. Mas, se ele viciou em maconha, ela, por sua vez, viciou em xingá-lo.
Nem sempre é o amor que mantém as pessoas unidas. Aliás, raramente, dizem os mais céticos.

Gênio Adormecido

Às vezes, boas sugestões surgem do campo onírico. Ontem eu sonhei que o José Serra havia virado ator de novela. Avaliando a questão, achei a ideia excelente. Ele tem todos os requisitos para fazer parte do núcleo de atores da melhor idade da Rede Globo. Veja só, eu sou um gênio adormecido. Sou um gênio enquanto durmo. Quando acordo, minha genialidade se dissipa. É, já ouvi histórias de pessoas que falam árabe enquanto dormem e quando acordam não sabem nem o que é al-mofada.
Fica aí a dica: Cojac no Projac. Só aconselho que o Serra não faça papel de vilão, senão é capaz que ele seja alvejado por bolinhas de papel quando sair às ruas e todos sabemos que isso é muuuuuuuuuuuuuuito perigoso.
Será que hoje à noite eu vou sonhar com a Xuxa no Ministério da Educação?

terça-feira, janeiro 11, 2011

Esclarecimento Definitivo

Ficção e realidade se confundem completamente. Sempre foi assim. Os sofistas, há cerca de três mil anos, enxergavam isso e achavam que fantasiar e alterar os fatos através da emoção e de elementos subjetivos eram caracterísitica intrínseca da natureza humana. Mais que isso, essa própria "confusão", para eles, eram a REALIDADE.
No mundo ocidental, racional, formal, objetivo de hoje, segue a luta para se separar razão e emoção, ficção e realidade, mas não tem jeito. As coisas andam juntas. Simplesmente, porque não há UMA realidade absoluta, uma vez que, sempre, alguém a enxergará, e dará a ela uma interpretação. É claro que isso não dá o direito ao ser humano de mentir descaradamente a fim de se safar de suas responsabilidades.
É, de fato, uma complicação esse tal negócio de viver em sociedade. Duas cabeças, duas sentenças. Sete bilhões de cabeças, sete bilhões de sentenças. Por isso, tivemos que criar e aprimorar regras de convivência coletiva. O ser humano, por si, é incapaz de ser imparcial em questões que envolvem interesses próprios, ou de chegados. O ser humano é incapaz de viver coletivamente sem que haja algum sistema hierárquico, alguma autoridade superior, alguma coisa que diga, acima dos interesses pessoais, que o certo é isso e não aquilo, que você terá que fazer o que nós mandamos e não o que você quer (os anarquistas que me desculpem).
Inventaram, então, o Estado, que evoluiu, até se chegar na forma clássica dos três poderes, elaborada por Montesquieu, e aceita pela mesma sociedade ocidental, tradicional, formal, objetiva, legal, como a melhor fórmula para a convivência de seres humanos em grupo.
Estou com Nietzsche, que dizia: nós não nascemos para viver em sociedade. Por outro lado, se a lei número um da natureza é a perpetuação da espécie, parece-me claro que nós, humanos, estaríamos fodidos se não tivéssemos nos unido. Não teríamos como sobreviver nessa selva sem o trabalho coletivo. E o trabalho coletivo foi tão bem feito que acabou destruindo a selva, mas esse é outro assunto.
Ou seja, não nascemos para viver em sociedade, do ponto de vista subjetivo, porque é fato que cada um de nós se acha a pessoa mais importante do mundo e cada um de nós acha que os nossos próprios problemas são mais importantes, mais urgentes e mais complicados que os problemas dos outros. Mas foi questão de sobrevivência, foi para o bem da espécie humana (e para a desgraça de todas as outras espécies do planeta) que nós nos unimos. E hoje, mesmo do ponto de vista subjetivo, que sujeito, além dos eremitas, de um punhado de desiludidos radicais e dos torcedores do Botafogo, gostaria de ficar de fora do convívio social?
Então, estou e não estou com Nietzsche. E não sei se estou, porque sou um ignorante. Tudo ao mesmo tempo, na maior confusão. Esta é a minha justificativa, a minha clara explicação, o porquê deste escrevinhadeiro que vos fala gostar tanto de misturar ficção com realidade, crônicas do cotidiano com delírios, poesia com frase de banheiro. Afinal, não me pretendo a nada. Já diz o humilde cabeçalho da minha humilde página.
Não entenderam? Apedeutas!