quinta-feira, novembro 04, 2010

Voto Behaviorista

Passada a eleição da Dilma, para continuarmos a falar de eleição, vieram as eleições legislativas nos Estados Unidos. Nada melhor que falar de política, futebol e da mulher dos outros. Falemos, então da política dos outros, sempre como desculpa para falar da nossa política.
Obama sofreu uma derrota acachapante, como dizem por aí. Principalmente na Câmara dos Deputados deles, que acho que eles chamam de Câmara de Representantes ou algo assim. No Senado, o governo ainda salvou uma leve maioria e serve de consolo que algumas figuras importantes do tal "Tea Party", um grupo de Republicanos ultra-conservadores, não conseguiram se eleger.
Pois é, seja aqui ou seja nos Estados Unidos, as pessoas sempre votam de acordo com a lógica pavloviana: na base do estímulo e da privação. Se os governos tentam moldar a sociedade, a sociedade também tenta moldar os governos. Foi o que aconteceu nos EUA e também foi o que aconteceu por aqui.
Pode parecer ilógico que um norte-americano que está desempregado resolva depositar seus votos justo naqueles que defendem a mínima intervenção do Estado na economia, como é o caso dos Republicanos. Mas é lógico que o norte-americano que está desempregado vote nos Republicanos porque, com isso, ele está punindo o governo Democrata, ele está dando um choque no Obama, como fazem os behavioristas com os ratinhos no laboratório ao buscarem desenvolver alguma espécie de comportamento negativo.
Aconteceu o fenômeno contrário aqui no Brasil, quando uma enorme quantidade de pessoas votou na Dilma porque a vida delas melhorou com o governo Lula. Não há nada de errado nisso. É a lei do mercado eleitoral. A primeira eleição do Lula, contra o Serra em 2002, é um exemplo de voto punitivo, porque a população queria demonstrar seu descontentamento com o governo FHC.
É claro que existem outros fenômenos que podem definir uma eleição. Essa ideia do voto behaviorista é baseada numa leitura simplificada de uma realidade extremamente complexa. Senão, jamais aconteceria de um governo bem avaliado pela população, como o da Marta Suplicy, que deixou a Prefeitura de São Paulo com um índice de aprovação de cerca de 60%, perder a disputa pela reeleição.
Mas, em geral, a lógica do voto behaviorista funciona. Ela é regra e não exceção. E é bom que seja assim. É ruim quando fatores extra-campo decidem uma eleição. É ruim quando um governante bem avaliado põe (ou quase) tudo a perder por alguma besteira (vide Clinton e a estagiária). Mas, acontece.

Eu estava na praia com a Vivi no feriado do 12 de Outubro, quando comecei a escutar a conversa de dois tucanos. Confesso que me surpreendi, porque, quando eu já esperava os velhos comentários de sempre ("esse povo burro vai eleger a Dilma por causa da 'bolsa-esmola' que recebe"), um dos sujeitos, simplesmente, disse: "Na reeleição do FHC, eu votei nele porque eu achava que seria o melhor para mim; é justo que o povo pense assim também e agora vote na Dilma". E completou: "Nós precisamos parar com essa hipocrisia de dizer: voto neste ou naquele porque será melhor para o País; nós votamos naquele que achamos que será melhor para nós mesmos".
Não quero dizer que seja certo ou errado pensar assim. Também não acho que todos votam desta maneira. No entanto, devo reconhecer que achei a fala do tucano muitíssimo honesta, e acho, também, que a maioria absoluta da população (independentemente de classe social, ouviu senhor Jaguaribe?) escolhe em quem votar de acordo com essa lógica. É por isso que o voto, via de regra, é behaviorista. Eu puno quem não foi bem e premio quem foi bem (pra mim).
É simples assim? Não, por isso existem tantas exceções a essa lógica. E existe, é claro, um bocado de forças que tentam manipular essa percepção do que foi bom e do que não foi bom. Aí entram imprensa, o próprio governo, sindicatos, movimentos sociais organizados, empresários, produtores, tudo tentando puxar a sardinha pra própria brasa.
Porém, nada é mais forte que dinheiro no bolso da população e activia na geladeira de pobre, como disse a Marinalva. Na minha opinião, foi esse o fiel da balança que deu a vitória à Dilma. Do seu lado, estavam o Governo Federal, com o Lula usando a máquina pública à vontade e levando a Dilma para inaugurar até banheiro há mais de um ano; parte do empresariado (veja você, até o Abílio Diniz escreveu uma carta recomendando o voto na Dilma para os seus mais de 100 mil empregados); a maioria dos movimentos sociais organizados (exemplo: MST que, apesar de insatisfeito com o Lula, sabe que com Serra volta o risco de um novo Eldorado dos Carajás); quase todos os sindicatos e tantas outras forças, umas maiores e outras menores.
Do lado do Serra estavam: a grande maioria dos industriais (dentre eles, a indústria da comunicação); a maioria dos banqueiros; todos os grandes produtores de terra; uns poucos sindicatos; alguns movimentos sociais organizados (principalmente ONGs, que costumam fazer a festa em governos tucanos); a esmagadora maioria dos governantes dos grandes centros (basicamente Sul e Sudeste, à exceção do Rio de Janeiro, que estava forte com a Dilma); boa parte da elite intelectual (exemplo: turma da USP) e outros tantos.
Considero que os exércitos estavam fortes, mas, o que acabou fazendo a diferença? Sim, o activia na geladeira do pobre. E quem vai dizer que eles estão errados?