sábado, dezembro 08, 2007

National Geographic

Meu irmão, não sei com que propósito, sempre gosta de lembrar que, quando eu era criança, deixei minha tartaruga fugir. Essas histórias costumam ressurgir em épocas festivas, como o Natal que se aproxima. É só começarem as conversas de jantar e os causos começam a brotar um atrás do outro. E eu fico esperando o momento em que ele vai dizer: "E o Tomaz, que deixou a tartaruga fugir?" As risadas afloram, apesar de todos ali já terem escutado essa história várias vezes. Devo confessar que é engraçado mesmo. Meu irmão tem talento pra contar histórias e eu tenho talento pra dar a ele o material necessário.
Pois é, também confesso que assumi o meu jeito lerdo de ser. Esse mérito é da Vivi. Ela fez com que eu passasse a achar graça das minhas bobeiras e dos meus defeitos. Às vezes eu ficom bravo com coisas estúpidas e ela já ri, dizendo que eu sou um "reclamildo". Como negar? Estou há um ano e meio escrevendo reclamices aqui neste espaço. Sou um resmungão. E lerdo. Às vezes até pra resmungar. É, às vezes vou resmungar de uma coisa só muito tempo depois.
Notícia velha é notícia morta, não merece comentários. Isso é o que diziam os professores no curso de jornalismo. Se um jornal deu um furo, resta aos outros duas alternativas: embarcar nas sobras daquele furo com um pouco de dignidade, dando o devido crédito ao "furão", ou simplesmente ignorar a notícia. Logo vi que estava na profissão errada. Sou lento demais. Mas sou lento demais, também, pra decidir as coisas. Deixei-me levar pelos anos e, depois de ter alguns poucos indícios de que o jornalismo não é minha praia, decidi mudar de ares. Venderei água de coco em alguma praia paradisíaca do nordeste? Venderei camisas falsificadas do Corinthians pelas cidades-satélite? Ah, são muitas as possibilidades. Aceito sugestões.
Mas eu quero falar mesmo é dos animais lentos. Que moleque nunca jogou sal sobre uma lesma a fim de vê-la derreter, como a bruxa má do leste em "O mágico de Oz" (Só um comentário nada a ver: um amigo anarquista, certa vez, me disse que "O mágico de Oz simboliza a luta contra o comunismo. Vejam vocês...)? Sempre alguém diz: "Você sabia que se jogarmos sal sobre uma lesma ela derrete?" E os outros: "Dã, cala a boca". "Duvida?" "Ah, vamos jogar bola". "Quanto você quer valer (era o jeito engraçado que nós usávamos pra dizer "apostar")?" Até que, depois de uma rápida discussão, lá vão os moleques procurar uma lesma, o que não é difícil, porque as lesmas demoram seis semanas pra percorrer dois metros e ainda deixam aquele rastro gosmento. Na minha escola, havia muitas delas "circulando" por tudo o que era canto.
Acha-se a lesma, joga-se sal sobre ela e, dá-se a "mágica", que depois a professora de Ciências explica que não é mágica (explicação esta que eu não me lembro mais), dizendo, contudo, que não é correto sair por aí derretendo lesmas. O sacrifício de animais, como dissecar um sapo ou abrir um polvo, tem que ser feito dentro da ética dos cientistas, o que significa dizer: com um propósito científico, e nunca por molecagem. Como aquela professora acha que os grandes cientistas resolveram virar cientistas? Derretendo lesmas, é claro.
Outro animal interessante é o leão-marinho. Fora da água, parece uma lesma gigante. Aquela massa gigantesca, sobre o gelo, é um caçador lastimável. Não obstante, basta que ele caia na água pra virar um voraz engolidor de peixes, pingüins, focas e o que bobear. Na água, o leão -marinho faz valer a sua fama. Ele só precisa não dar mole pros tubarões.
Aqui em Brasília está chovendo pra caralho. Daqui a pouco, seremos obrigados a sair em busca de uma Nhá Benta. Mas que o tempo está perfeito pra ficar na cama assistindo a algum desses programas do mundo animal, isso está. Eu confesso que gosto. Foi em um desses programas que eu descobri que a pulga é capaz de saltar até duzentas vezes a sua própria altura, o que deixaria qualquer Michael Jordan no chinelo. Infelizmente, depois eu me esqueço de todas essas informações sobre os mais diferentes animais. Mas não é impressionante a paciência dos produtores desses programas? Os caras têm que deixar as câmeras ajeitadas não sei quantos séculos até captar as imagens desejadas. Fora aqueles programas em que eles acompanham a vida de um lobo-guará por sete anos.
Viram? Não é que eu sou lento. Eu sou paciente, meus amigos. Sou paciente. E essa história da tartaruga é intriga da oposição. Na verdade ela foi roubada por um vizinho invejoso que eu tinha e que ficava me espreitando por trás do muro. Chega de bobagens por hoje. Chove, chove e chove.

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Muito bom!
Mas, é o seguinte: deparei, esse fim de semana,com a citação correta do letrista de tango.
"Não se escreve no meio de uma grande dor, mas com a lembrança dela."
Bonito, não é?
Um abraço,
Miriam

8:22 AM  
Anonymous Anônimo said...

Tô, o paciente! Esse sua escrivinhação de hoje veio a calhar. Ontem li o Na praia, do impronunciável (pelo menos p meu inglês)McEwan. Tá, tá: não vamos aqui discutir os méritos do cara. O ponto é que não sei por que raios resolvi ler algo dele e o primeiro livro que tinha foi o Reparação. Gostei e, como vc sabe, qdo isso acontece fico obcecada pelo autor e começo a ler tudo o que o sujeito escreveu e despejou no mercado. Foi aí que entrou o Na praia. Bem, a história não vou contar porque pode não interessar (ainda que faça mais sentido a citação após conhecê-la), mas cito uma passagem do final que me tirou preciosos minutos de sono ontem à noite:
"Quando pensava nela, parecia-lhe surpreendente que tivesse deixado aquela garota com seu violino ir embora. Agora, é claro, via que a proposta recatada que ela lhe fizera era totalmente irrelevante. Tudo aquilo que ela precisava era da certeza do amor dele, e da sua garantia de que não havia pressa, pois tinham a vida pela frente. Amor e paciência - se pelo menos tivesse conhecido ambos ao mesmo tempo ..."

Amor e paciência. Combinam? Até pouco tempo atrás, minha visão de amor era pouco compatível com paciência. A falta de paciência acabou com o amor. A falta de paciência acaba com mta coisa. Mas qdo saber se é falta de paciência ou já é mesmo hora de tomar atitude?Sendo lugar-comum, a aceleração da vida moderna e as cobranças por decisões rápidas roubou um pedação da prudente paciência. Acho que vou ficar mais lerda...

12:54 PM  

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