O roubo do celular
Levei um esculacho de um ladrão. Estava eu chegando na rodoviária do plano piloto para pegar um ônibus para Caldas Novas, quando fui abordado por um trombadão de olhos trincados que veio logo perguntando se eu era cana. Respondi que não, enquanto pensava: fodeu - na minha carteira, que estava no bolso, havia uma quantidade incomum de dinheiro (120 contos), meu cartão, três folhas de cheque, todos os meus documentos e a passagem para Caldas Novas; eu também carregava uma mala com umas mudas de roupa, um livro do Fausto Wolff ("À mão esquerda") e as chaves de casa.
Fodeu, pensei. Esse cara vai me fazer uma limpeza e eu não terei nem como encontrar a Vivi na Pousada do Rio Quente e nem como entrar em casa, além daquela chateação de ter que fazer um boletim de ocorrência, cancelar cartão, sustar folhas de cheque e ir atrás de segunda via de documentos. Portanto, fodeu, pensei.
Mas o que o cara pediu foi o meu celular. Saquei do bolso o meu Motorola modelo mais simples que existe, que me custou menos de 100 reais, não tem absolutamente nada e já estava com as teclas meio emperradas. Quando ele viu aquele lixo em suas mãos, ficou mais que desapontado. Ele ficou chateadíssimo. E começou a dizer: "Porra, isso aqui é uma merda! Isso aqui... é ridículo, eu acho até que vou te devolver."
Eu estava com medo, é claro. Medo de tomar um tiro de graça, (sei lá se ele estava armado, porque ele não me mostrou arma nenhuma e nem eu pedi pra ver) medo de morrer por causa de uma besteira, além do medo material que eu já mencionei. Portanto, na hora não deu pra ficar ofendido. Apenas falei, um tanto envergonhado: "Meu celular é esse aí..." Quase pedi desculpas, mas também achei que não era o caso.
Ainda com meu ridículo celular nas mãos, o assaltante me falou, para minha total surpresa: "Me dá dez reais". Dez reais?, pensei. É isso o que ele quer? Fiquei quase feliz e, como continuávamos andando em direção à rodoviária, ele falou: "Anda mais devagar e me dá os dez reais antes de chegar ali [no local onde os ônibus estavam estacionados], se não quiser passar vergonha na frente de todo mundo". Abri minha carteira e vi que tinha duas notas de cinqüenta e uma de vinte. Puxei a de vinte e disse: "Tó vinte" (também achei que não era o caso de pedir o troco).
Ele pegou a nota e já ia saindo, quando eu não resisti, e pedi, com a maior delicadeza, se ele podia devolver meu celular. Ele titubeou. Eu disse: "Isso aí não vale nada, vai? Por favor..." Depois de refletir um pouco, ele me respondeu: "Eu vou levar. Vou levar porque tenho que resolver um negócio ali e se você achar que está sendo prejudicado corre atrás" Eu apenas respondi: "Tá bom" e continuei andando. Quando olhei para trás, o cara já tinha sumido.
Depois de uns minutos, eu estava encostado perto do ônibus, quando comecei a rir. Eu ri porque foi muito engraçado o jeito com que ele me falou que ia levar meu celular (confesso que ele não disse "prejudicado", mas um termo muito mais engraçado que, devido ao nervosismo da situação, eu não consegui gravar), mas a graça demorou uns minutos pra chegar (o tempo do cagaço ir embora); também ri de alívio, porque, contabilizando as perdas, foi realmente ridículo. Quase fiquei feliz de ter perdido vinte reais e um celular em vez de uma viagem para Caldas Novas, 120 reais, roupas, a chave de casa e todos os meus documentos.
É, os ladrões não costumam ter muita sorte comigo. A última vez que eu tinha sido assaltado foi há uns quinze anos, lá em São Paulo, quando eu e um amigo estávamos indo ao Morumbi assistir a um Corinthians e Santos. Resolvemos ir a pé, da casa do Sasha, que morava na Raposo, cortando o caminho por dentro de um parque. Lá estavam dois sujeitos com revólveres nas mãos, querendo que nós lhes entregássemos tudo que tivéssemos. O problema é que eu não tinha absolutamente nada. Eu havia deixado meus dez reais e meu RG na casa do Sasha, porque eu estava com medo que uma chuva iminente molhasse tudo. O Sasha enfiou os ingressos na cueca e também não tinha nada pra entregar.
Resultado: os caras levaram a minha camisa velha do Corinthians e um relógio do Sasha que era pior que o meu celular. Levaram pra coisa não ficar de graça. Depois, eu agradeci ao Sasha, porque ele salvou nossos ingressos, mas não quis encostar neles, por razões óbvias. Depois, o Corinthians enfiou 5 a 2 no Santos (bons tempos aqueles), com um show do Neto, e tudo ficou bem. Depois que esse cara levou meu celular, eu passei um feriado maravilhoso ao lado da Vivi e dos pais dela, e tudo acabou melhor que bem. Agora eu estou tentando não perder o número do meu pré-pago, mas o "sistema" da TIM, que sempre está realizando operações de melhoria, não quer colaborar.
1 Comments:
Poxa, precisou chegar em Brasília pra ser assaltado?! E a violência paulistana? É, acho que aqui não teria ficado só por 20 reais e um celular chumbrega. Nóis aqui somo profissional.
Cuide-se,
Miriam
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