quinta-feira, julho 19, 2007

O Futuro do Esporte num País sem Futuro

Lembrei-me de uma entrevista que assisti da Paula, ex-jogadora de basquete, logo depois de deixar a Secretaria de Esportes de Alto Rendimento, ligada ao Ministério dos Esportes. Paula não demorou muito a perceber que o que o governo queria era fazer marketing com o nome dela, como se essa atleta campeoníssima fosse uma garota-propaganda, que recebe um cachê e empresta sua imagem ao produto. Paula não aceitou esse jogo e, quando viu que o discurso do governo para convencê-la a assumir a pasta não passava de bravata, pulou fora.

Paula sabe como ninguém como é difícil se transformar em um atleta de ponta num país que não tem nenhuma política séria voltada para o esporte e vive de dois ingredientes para conseguir resultados: a aparição esporádica de valores individuais nos mais diferentes esportes, como o nosso Guga, e a paixão lancinante pelo futebol que, mesmo sem um trabalho sério de formação de atletas, beneficia-se pela enorme quantidade de praticantes que, mergulhados num bolsão de miséria, vêem nesse esporte a chance de driblar a pobreza e chutá-la para bem longe. O futebol, no Brasil, alimenta-se dessa fábrica de desesperados.

Uma das poucas exceções a esse quadro é o vôlei, que conseguiu combinar a massificação do esporte com um trabalho eficiente de formação de atletas de ponta. Não à toa, o Brasil, já há muitos anos, briga por medalhas em todas as Olimpíadas, tanto no feminino, quanto no masculino, que acabou de ganhar a liga mundial pela sétima vez, ao mesmo tempo em que faturou o campeonato mundial juvenil.

O tênis figura entre a esmagadora maioria dos esportes que, no Brasil, não têm nem uma coisa e nem outra; ou seja, o tênis brasileiro não conta com um trabalho de massificação do esporte, tampouco apresenta um trabalho eficiente de formação de atletas competitivos internacionalmente. É no primeiro pilar que forma uma potência em qualquer esporte - a massificação - que os dirigentes pecaram feio ao não aproveitarem a Gugamania. Nunca se viu tanta gente interessada por tênis como nos anos em que o Guga jogava de igual para igual contra qualquer tenista do mundo. De repente, patrocinadores começaram a surgir e a televisão passou a transmitir os torneios. Antes disso, só a antiga TV Manchete, cujo dono era fanático por tênis, dignava-se a mostrar partidas de tênis. Enfim, a Gugamania esfriou e, como ele mesmo disse, hoje está tão difícil para um jovem praticante se transformar em tenista profissional quanto há uma década.

É uma pena. Mas o fato é que nós vivemos em uma sociedade com inúmeros problemas básicos, como falta de alimentos, de saneamento básico, de infra-estrutura, de moradia, de emprego, de educação de qualidade etc. Se nem esses problemas são solucionados, por falta de competência e de vontade política dos nossos governantes, imagina se o esporte, que para dar frutos precisa de planejamento e de um investimento de longo prazo, consegue se desenvolver? Por falta de competência e de vontade política, o esporte é deixado de lado pelos nossos administradores, que ignoram o imenso salto de qualidade em todas as áreas que seria possível se fosse feito um trabalho integrado entre o esporte e o desenvolvimento básico do ser humano.

Falar nisso é chover no molhado, obviamente, porque é óbvio que os nossos dirigentes sabem de tudo isso, mas eles também sabem que um trabalho sério e sólido demoraria muito tempo para dar retorno, e eles querem faturar,tanto politicamente quanto financeiramente, o mais rápido possível. É por isso que o governo convida a Paula para uma secretaria criada para a formação de atletas profissionais, sem dar a ela as condições mínimas para que novas Paulas surjam. Por quê? Ora, basta pagar pela grife, porque uma política de formação de atletas de alto rendimento, todos sabem, demora anos para dar resultado. E as eleições não esperam. O mesmo discurso cabe para as federações que deveriam administrar as modalidades esportivas do país.

Nós temos, no Brasil, uma situação terrível, porque o esporte só se transformaria em um motor de desenvolvimento humano (transformar-se em potência olímpica seria a conseqüência lógica) se os dirigentes mudassem de postura. Infelizmente, isso não tem como acontecer, pois nós participamos de um jogo de dados viciados. Para mudar a postura, o dirigente teria que se profissionalizar, teria que apresentar para a sociedade um resultado efetivo. Ou seja, ele teria que sair, dar lugar para quem é do ramo e, com isso, perder a boquinha dele. Nossos dirigentes só estão interessados em fazer lobby e em manter a roleta girando em benefício próprio. Nada de aplicar dinheiro público e correr atrás de patrocínio e parcerias com a iniciativa privada em benefício do coletivo. Isso nunca! Porque nós vivemos na terra do coronelismo, das oligarquias, da burocracia burra, das "comissões", da bandalheira.

De vez em quando, aproveita-se do talento individual de pessoas que dão o sangue para conseguir alcançar um nível de competitividade e se fatura em cima da imagem delas. Quando surge um self made man como o Guga, rapidamente aparece a turma do tapinha nas costas, que chega na maior cara-de-pau e diz: eu sempre acreditei nesse garoto. Quando aparece um Guga, chovem empresas querendo patrociná-lo, empresas essas que somem na mesma rapidez com que surgiram se os resultados começam a rarear.

Alguma novidade nessa ladainha toda? É lógico que não. Mas é sempre bom reforçar, porque nós estamos em época de Pan, quando a mídia ufanista, políticos oportunistas e mais um punhado de aproveitadores alimentam um clima de patriotismo que, na verdade, serve como cortina de fumaça para esconder a falta de seriedade com que o esporte brasileiro é levado, assim como todas as outras áreas.

PS: Só pra deixar bem claro, esse discurso vale para TODOS os governos que já tiveram o prazer de administrar o nosso país, desde os chefes das capitanias hereditárias até os atuais, em todos os níveis. Desconfio, também ,que servirá para os próximos, pelo menos até o fim dos meus dias.