Migalhas de Ouro
Ufa, acabou esse tal dePan. Eu não agüentava mais esse clima ridículo que se formou em torno de uma competição paradoxalmente falida e superfaturada. A imprensa encheu o saco até torrar com o discurso da busca pelo ouro. Vamos lá, Brasil! Vamos ultrapassar os cubanos! E dá-lhe nego torcendo desesperadamente para um alemão com cara de alemão e nome de alemão ganhar as provas de iatismo. Lá vai o outro se emocionar com o hipismo, em que cavalos de nomes ridículos, como Rufus, Chup Chup ou sei lá o quê, valem milhões de dólares e se alimentam com ração holandesa. E o tal do Balobê de Ruê (me recuso a aprender como se escreve o nome desse cavalo que custou U$ 5 milhões)? Deve estar aposentado, pastando nos gramados de Monte Carlo e namorando as éguas mais famosas de Hollywood. Se bem que, de acordo com as informações de um animal meio fofoqueiro, parece que o tal do Balobê não é muito chegado.
Aos que me acusam de ser antipatriótico, eu respondo: foda-se. Se pra ser patriota eu tenho que me emocionar com boliche e soltar rojões a cada vitória do Robert Scheidt, o garoto-propaganda da Abrabin, eu sinto muitíssimo. Em bom português: Include me out.
O pior é que eu gosto dessas competições. Não tanto do Pan, e menos ainda desse no Rio de Janeiro, porque o patriotismo de araque acaba me tirando do sério, já que o Brasil acaba ganhando uma porrada de medalhas que jamais ganharia se fosse numa Olimpíada, quando competem os principais atletas do mundo inteiro. Numa Olimpíada, a mídia também alimenta o patriotismo picareta, mas como o Brasil acaba levando ferro em quase tudo, substitui-se a euforia dourada pelo velho discurso de que o importante é competir. Na Olimpíada, faz-se o maior alarde para cada nadador brasileiro que consegue chegar a uma final olímpica, mesmo que depois ele chegue em último e, mesmo quebrando o recorde sul-americano da prova, vários segundos atrás do primeiro colocado.
Atletas que por ventura lessem essas minhas palavras poderiam ficar putos comigo. Mas eles deveriam estar do meu lado (afinal, eu estou do lado deles), porque no Brasil não existe uma política voltada para o esporte. Não existe incentivo de ordem alguma, o que significa dizer que, toda medalha que eles conseguem é fruto de uma superação desgraçada (tirando os bem nascidos que podem praticar iatismo e hipismo, e parabéns para eles também). O pior é que o atleta se mata, treina nas horas vagas, se alimenta mal, faz uma porrada de esforços hercúleos para chegar a uma Olimpíada.
Aí o brasuca ainda vai lá, enfrentar um monte de holandeses, australianos, americanos, todos muito bem alimentados, treinando nas melhores condições possíveis, recebendo dinheiro dos patrocinadores e bolsa pra estudar nas melhores universidades.
Aí o brasuca se supera que nem um desgraçado e volta pra casa com uma medalha. Êêêêêê! Faz-se a maior festa; o Galvão Bueno se emociona e diz que já sabia; o político abre o sorrisão; chovem empresários convidando o cara pra fazer propaganda na televisão.
E depois que passa a empolgação, que todos já se aproveitaram ao máximo desse Ulisses de Pindorama? Depois nada. O sujeito cai no esquecimento, nada se faz pra desenvolver o esporte e vamos que vamos atrás de outro ex-vendedor de picolé e ex-servente de pedreiro que, sabe-se lá como, conseguiu virar um atleta de ponta. Aliás, sabe-se sim. Simplesmente, através de um esforço individual gigantesco, somado a um talento que, esse, não se sabe direito de onde vem.
Enfim, eu gosto de Olimpíada. Gosto porque é uma oportunidade de assistir a vários esportes que, em condições normais de pressão e temperatura, nós nunca vemos na televisão. E gosto porque é uma festa bonita, e uma chance para que vários atletas desconhecidos consigam alguma notoriedade que lhes permita praticar seu esporte com um pouco mais de estrutura. Também é uma chance única para vermos em ação os melhores atletas do mundo, competindo entre si nas mais diferentes modalidades.
Seria bom se os Estados Unidos e o Canadá enviassem seus melhores atletas aos Jogos Pan-americanos? A maioria diria que não, porque isso implicaria em muito menos medalhas para o Brasil. Eu diria que sim. Eu gostaria de ver os melhores competindo, mas os norte-americanos estão certíssimos. Pra que mandar pra cá o que eles têm de melhor se isso em nada acrescentaria à carreira deles? Melhor mandar os juvenis, para que eles ganhem experiência internacional. Além do mais, eles dão conta do recado muito bem.
Por isso eu dei graças aos céus que o Pan acabou. Porque quem merecia faturar - os próprios atletas - é quem menos se beneficia com essa situação. A elite oportunista, através da nossa lamentável mídia, faz de tudo pra que nós, os bobos, acreditemos que o Brasil é uma potência olímpica. Enquanto isso, tira-se leite de pedra, porque, como eu já disse antes, desenvolver o esporte pra valer dá muito trabalho e demora muito. O problema é que a elite quer faturar o mais rápido possível em cima do esforço desses pobres atletas.
Agora eu estou aliviado, porque o meu mau humor passou. E que ninguém pense que essa merda toda me impede de me emocionar. Ontem, na Maratona, a vitória do Franck Caldeira foi muito bonita. Ele foi buscar o guatemalteco, que estava uns trezentos metros à frente dele (pra quem não tem idéia, essa distância é bem complicada de tirar) e assumiu a liderança da prova a menos de dois quilômetros do final. O Franck passou o gutemalteco como se fosse um carro de Fórmula 1 passando um carro de passeio. Deve ter feito até ventinho no cabelo do adversário. Essa foi na raça.
Mas não me peçam pra comemorar o ouro do vôlei, pois nas Américas o Brasil não tem adversários à altura. E por que será? Será que é porque o vôlei é um dos poucos esportes levados a sério por aqui? Que pena, porque nós poderíamos ser bons em qualquer esporte. E que pena, porque eu acho vôlei um pé no saco.
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