terça-feira, junho 26, 2007

Tal Pai, Tal Filho

Eu havia prometido a mim mesmo que não falaria desse caso dos quatro estudantes de direito que espancaram a empregada doméstica no Rio de Janeiro. Eu havia feito essa promessa porque esse é o tipo de notícia que fala por si, além dos especialistas de plantão da imprensa já terem dito o bastante. Mas, confesso, não agüentei quando li a entrevista que o pai de um dos estudantes concedeu à Folha de S. Paulo.
A fala do sujeito traduz claramente como pensa a elite brasileira. Tão claramente como poucas vezes eu havia visto nas páginas da imprensa- ou mesmo de Veja. Quando ele diz que não está certo prender o filho dele - "uma pessoa que tem caráter" - com bandidos, ficou claro pra mim como o moleque, ao ver uma mulher com cara de povo na rua, se sente à vontade para descer do carro e surrá-la.
Um pai desses, que tem a coragem e a cara-de-pau de contestar a prisão de alguém que espanca covardemente uma pessoa, por puro sadismo, rouba-lhe o dinheiro e ainda diz, para se justificar: "Eu pensei que fosse uma prostituta"; um pai que diz pra toda a elite brasileira ouvir, que o filho dele tem caráter, ao contrário dos outros "bandidos" que estão na cadeia e, por isso, não deveria ser misturado com eles, fica muito claro que a cabeça completamente oca desse estudante e a de seus amigos é fruto de um discurso que começa em casa.
Associações do tipo: mulher pobre é puta e homem pobre é vagabundo ou ladrão (ou os dois), normalmente, começam a ser alimentadas desde cedo, quando a cabeça da criança está em formação. O pai, em casa, faz piadas racistas, diz que preto é tudo ladrão, diz que essas empregadinhas são tudo umas putas - e o filho assimila. Caráter é algo que se constrói em casa e, se o pai é um bosta desses, a chance do filho ser um bostinha é muito grande. Esse bostinha cresce achando que quem não tem dinheiro não presta e ainda é uma ameaça pra quem tem dinheiro.
Hoje, ao ler essa entrevista, eu consegui me sentir ainda pior do que quando eu soube da notícia. Quanto à imprensa, ai meu Deus, a imprensa: bem lembrou o Nelson de Sá: quando a barbaridade é feita por gente da elite, essa gente é tratada assim: "grupo de jovens agride empregada doméstica". Quando é gente pobre, fala-se: "Bandidos aterrorizam vítimas...". É claro. Quem compra jornal? Quem consome os produtos que a mídia oferece? Em sua maioria, imbecis, como o pai desse delinqüente de merda.