terça-feira, junho 19, 2007

Coleguismo

Esse episódio do Renan Calheiros tem servido direitinho pra exercitar a nossa capacidade de indignação. Quando o senador Epitácio Cafeteira - antes de arranjar uma licença tão verdadeira quanto os recibos do Calheiros pra se livrar da relatoria - diz que seu colega deveria ser absolvido porque provou ter condições de pagar as gordas pensões à Mônica, na verdade ele está dizendo o que todo mundo sabe: que rico no Brasil está liberado pra cometer crimes. É só ter dinheiro que a coisa tá resolvida. De vez em quando, a Polícia Federal pega um ou outro boi de piranha só pra não perder completamente a credibilidade. E os nossos bois de piranha de luxo, logo conseguem direito de responder o processo em liberdade e, quando condenados, emplacam um regime aberto. Claro, pra rico vale sempre aquela história toda de réu primário com bons antecedentes.
Chegamos a um ponto tão crítico da nossa curta história republicana que seria preciso adaptar a famosa frase, que no Brasil ficaria bem encaixada desta forma: aos ricos, tudo, aos pobres, os rigores (nunca os benefícios) da lei.
"Você já viu pobre conhecer rico?" Foi com essa indagação que um dos supostos compradores dos bois de Renan Calheiros respondeu ao repórter da Globo se ele conhecia o senador. Não, né? No Brasil, o rico só conhece o pobre em época de eleição. Em época de eleição, tenho certeza que o Renan Calheiros vai a essas periferias de Maceió e ao interior de Alagoas pra comer buchada e tomar uma cachacinha. Ou seja, de oito em oito anos, porque o Senado lhe caiu muito bem.
O Senado caiu muito bem ao Renan Calheiros porque é o local onde mais se cativa o coleguismo. Se essa instituição está sangrando, como disse o colega de partido do Renan Calheiros, o ex-governador de Pernambuco Jarbas Vasconcelos, eu não sei. Mas o que não pára de jorrar das entranhas do poder público, seja qual for, é muita merda. É tanta merda que, às vezes, transborda.
Sim, chegamos a um ponto crítico. Tão crítico que o Renan Calheiros, na maior tranqüilidade, apresenta recibos evidentemente falsos para justificar vendas de bois que quase chegam a R$ 2 milhões. Agora vem a simples pergunta, que até uma criança de seis anos que estuda num colégio público de São Caetano do Sul seria capaz de responder, sem chocar seus pais: "Se não tem mutreta nesta história, por que está tão complicado comprovar a origem do dinheiro?"
É claro que tem mutreta, responde a criancinha de seis anos. Até ela sabe. Mas o Renan Calheiros, atualmente, é um grande líder do PMDB, o fiel da balança que tem dado tanta tranqüilidade ao Governo Lula. Quanto à oposição composta por PSDB e PFL... ops, quer dizer, DEM, esta também não parece muito empenhada em causar problemas ao parceiro de outrora e potencial parceiro de um futuro não tão longínquo assim. Tanto é assim que o próprio PSDB incumbiu à sua filial disfarçada (mal disfarçada, por sinal), o PPS, de, em parceria com PV e PSOL, chatear o Renan Calheiros.
É por isso que o Zé Simão diz, diretamente do país da piada pronta, que essa história do Renan Calheiros não vai acabar em pizza e, sim, em churrasco. Está armada a churrascada para breve, e vocês podem ter certeza que nenhum pobre será convidado - a eleição ainda está longe.