Supercândida
Ouvi dizer que o Perseu Abramo, quando dava aula no curso de jornalismo da PUC - curso que ele ajudou a fundar e, depois de uns anos, outros tantos ajudaram a afundar -, gostava de pedir aos alunos que descrevessem, por escrito, objetos banais, como uma caixa de fósforo. Esse singelo exercício ajudaria os jornalistas a desenvolver uma ferramenta fundamental: a capacidade de passar para o papel aquilo que ele viu e apurou. Se o aluno conseguisse descrever uma caixa de fósforo de maneira convincente (fiel e, ao mesmo tempo, interessante), estaria apto a escrever sobre qualquer coisa.
O problema é que essa técnica do Perseu Abramo deve ter sido copiada por algum professor do curso de publicidade que, rapidamente, adaptou a técnica aos seus propósitos. O professor Plagiário, um belo dia, chegou à sala de aula carregando um tijolo, o que provocou risos nos alunos. Calmamente, Plagiário repousou o tijolo sobre a mesa e disse: "Convençam-me a comprar esta peça". Sim, se o publicitário é capaz de descrever um tijolo de maneira atraente, também está apto a vender qualquer coisa.
Brincadeiras à parte, foi isso que eu pensei, hoje de manhã, quando vi uma propaganda de cândida afixada à parede do vagão do metrô. Porra, é cândida, aquele líquido branco que estraga as roupas. Não, senhor: é Supercândida, o superproduto da supermulher. Pois é, na propaganda vale tudo e, se grande parte da sociedade é machista, sejamos supermachistas. A propaganda não parava por aí. Na verdade, o que eu mais gostei foi de umas superfrases que enfeitavam o pé do cartaz. Não me lembro bem, mas era algo assim: "Única com rótulo que não sai na água"; "Bico com lacre: supereconomia!"; e a melhor de todas: "Embalagem anatômica: superpegada!"
Superpegada? Essa foi demais pra mim. Quem foi o gênio que inventou uma coisa dessas? Mas, meu bom Jesus, é cândida. O que fazer para diferenciá-la das outras marcas de cândida? Nunca olhei o rótulo (que não sai na água) desse produto, mas tenho certeza que todas as fórmulas de todas as cândidas do mercado serão absolutamente idênticas. Caso contrário, essa informação estaria no cartaz: "A única com metilcloroisotiasolinona: Super...seja lá o que for isso!
Sim, o que fazer para diferenciá-la? Recheando a propaganda de superlativos. Essa tal superpegada deve ser fruto do total desespero de um publicitário que, olhando para os céus, se perguntava: o que mais eu posso inventar sobre essa supercândida? Lembrou-se, então, do tijolo do Plagiário, que era de fácil manuseio, o supertijolo do superpedreiro, com superdesign, ótimo para a superpegada de mãos supercalejadas. Super!, bradou o infeliz, e escreveu essa merda que eu tive o prazer de ler, numa manhã gelada, dentro do metrô.
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