Lá vai meu ônibus
Foram muitos meses chegando flores, cartas, visitas inesperadas e, muitas vezes, indesejadas de parte a parte. As famosas visitas de cortesia. Um sujeito não faz questão de visitar, o outro não faz questão de receber a visita, mas o encontro se dá, por razões que transcendem a vontade de ambos. A mulher, já cansada, também era vista como viúva, antes mesmo de enterrar o marido. E os vizinhos agiam como abutres.
Sim, um bando de abutres. Aquele ali, que viveu na casa em frente durante tanto tempo, nunca se deu ao trabalho de levantar os olhos e dizer bom dia, ou de apenas tentar sorrir. De um momento para o outro, virou um ser solícito, cheio de compaixão e de cuidados, interessado no cotidiano da família e se a viúva que ainda não era viúva necessitava de ajuda para carregar o lixo para fora de casa. Igual ao tal vizinho existiam tantos outros. Praticamente a rua inteira.
No começo, o Carlos se incomodava. Cada manifestação de carinho daqueles que nunca haviam se interessado por sua vida era vista por ele com aborrecimento. “O que esse cara quer comigo? Só porque eu estou morrendo ele vem cheio de delicadezas? Que se foda.”
Depois, com tudo se acaba acostumando. E a raiva virou indiferença, porque, afinal, o Carlos estava mesmo morrendo. Para que esquentar a cabeça com pessoas que nunca quiseram saber dele? Elas que dissessem bom dia e que ajudassem sua mulher a botar o lixo para fora. Passou, então, a dizer incongruências cada vez que alguém lhe dirigisse a palavra. Dizia: ratos andarilhos se pelam na formosura do amanhecer.
Sozinho, ele achava graça da cara de “lá vai meu ônibus” que as pessoas faziam antes de sair correndo, desorientadas. A mulher ralhou, dizendo que já falavam por aí que o Carlos estava louco. "A doença deve ter atingido o cérebro", alguém chegou a dizer. Mas, como com tudo se acaba acostumando, ela mesma começou a gostar da brincadeira.
Por um tempo, eles se divertiram com esse passatempo. E a mulher descobriu que tinha um talento incrível para inventar frases malucas. Ela inventava e o Carlos falava por aí. Até que as pessoas passaram a evitar o Carlos cada vez mais, porque não sabiam como lidar com aquela situação.
Acabou que os vizinhos, com o moribundo, voltaram a não falar nada. Como antes. Mas ao enterro, de ônibus ou não, quase todos foram.
Sim, um bando de abutres. Aquele ali, que viveu na casa em frente durante tanto tempo, nunca se deu ao trabalho de levantar os olhos e dizer bom dia, ou de apenas tentar sorrir. De um momento para o outro, virou um ser solícito, cheio de compaixão e de cuidados, interessado no cotidiano da família e se a viúva que ainda não era viúva necessitava de ajuda para carregar o lixo para fora de casa. Igual ao tal vizinho existiam tantos outros. Praticamente a rua inteira.
No começo, o Carlos se incomodava. Cada manifestação de carinho daqueles que nunca haviam se interessado por sua vida era vista por ele com aborrecimento. “O que esse cara quer comigo? Só porque eu estou morrendo ele vem cheio de delicadezas? Que se foda.”
Depois, com tudo se acaba acostumando. E a raiva virou indiferença, porque, afinal, o Carlos estava mesmo morrendo. Para que esquentar a cabeça com pessoas que nunca quiseram saber dele? Elas que dissessem bom dia e que ajudassem sua mulher a botar o lixo para fora. Passou, então, a dizer incongruências cada vez que alguém lhe dirigisse a palavra. Dizia: ratos andarilhos se pelam na formosura do amanhecer.
Sozinho, ele achava graça da cara de “lá vai meu ônibus” que as pessoas faziam antes de sair correndo, desorientadas. A mulher ralhou, dizendo que já falavam por aí que o Carlos estava louco. "A doença deve ter atingido o cérebro", alguém chegou a dizer. Mas, como com tudo se acaba acostumando, ela mesma começou a gostar da brincadeira.
Por um tempo, eles se divertiram com esse passatempo. E a mulher descobriu que tinha um talento incrível para inventar frases malucas. Ela inventava e o Carlos falava por aí. Até que as pessoas passaram a evitar o Carlos cada vez mais, porque não sabiam como lidar com aquela situação.
Acabou que os vizinhos, com o moribundo, voltaram a não falar nada. Como antes. Mas ao enterro, de ônibus ou não, quase todos foram.
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