Ditadura Ideológica
Na sociedade do sim ou não, certo ou errado, verdadeiro ou falso, somos obrigados sempre a tomar partido. É inaceitável que você não escolha um lado e, se ficar com muita reflexão, é classificado logo como "em cima do muro".
Experimente responder "não sei" para perguntas do tipo: Você acredita em Deus?, e, Qual é a sua posição política? Eu sei lá se Deus existe. Vou me preocupar (ou não) com isso, quando (se) chegar a hora apropriada. Deixe-me em paz. Sobre a minha posição política, você está mesmo interesado em ouvir? Acredito que não. A pessoa quer saber se eu sou de esquerda ou de direita, se eu sou capitalista ou comunista, se eu sou a favor ou contra o Fidel Castro, se eu sou petista ou tucano. Depois ela quer saber, numa versão bem resumida, por que eu sou isso ou aquilo. Depois acabou, cale-se, vamos falar de futebol: você é corintiano ou palmeirense?
Se hoje em dia é assim, imagine em Cuba no início dos anos 1960. Algumas situações históricas nos obrigam efetivamente a tomar partido. Em Cuba, quem era a favor da revolução ficou e aderiu, quem era contra se mandou (ou tentou se mandar). Ontem, eu e a Vivi assistimos a um filme do mesmo diretor de Morango e chocolate, o Tomás Gutiérrez Alea, chamado Memórias do subdesenvolvimento. É interessante, exatamente, porque fala de um intelectual cubano chamado Sergio que, em pleno ano de 1961 (a Revolução cubana havia começado em 1959), que resolve permanecer em Cuba sem tomar partido, levando a mesma vida que levava antes.
Sergio vê os pais, a mulher e o melhor amigo abandonarem a ilha com destino aos Estados Unidos, e diz: lá eu já conheço, aqui eu não sei como as coisas vão terminar. É interessnate, também, como o intelectual sente um incômodo profundo com o subdesenvolvimento de Cuba. Ele sempre foi uma pessoa que tentou viver à européia e, por pensar que a típica cubanita Elena lhe joga o tempo todo na cara a condição de subdesenvolvido, ele a abandona durante uma visita à casa que foi de Hemingway.
O intelectual, em um de seus discursos antiterceiromundismo, até se vale de uma metáfora geodeterminista à triste condição dos trópicos, dizendo que "aqui as coisas amadurecem e apodrecem muito rapidamente". E continua com sua vida de tempos pré-revolução, vivendo de aluguel, morando num apartamento enorme, cheio de discos, obras-de-arte e livros, e passeando pelas calles de Havana como se fora um estrangeiro.
O filme me fez pensar o óbvio: não tem como não tomar partido, não escolher um lado. Se você não escolher, o sistema força a sua escolha. É como quando nós éramos crianças e, durante as aulas de Educação Física, o professor dividia os times. "Mas eu quero ficar no outro". Sinto muito. Não pode. Alguém pode dizer que eu estou sendo ingênuo porque, na verdade, nós não escolhemos nada. Tudo bem, essa é uma outra discussão, que nós podemos deixar pra uma outra hora. Mas eu fiquei pensando, ao ver aquele intelectual no ninho de resistência ao imperialismo norte-americano a "ignorar" sua condição histórica, como é complicado (pra não dizer impossível) se livrar da ditadura ideológica a que vivemos atrelados.
Isso também me fez lembrar o livro Século das luzes, do cubano Alejo Carpentier, que acusa de uma maneira belíssima que a Revolução Francesa ainda não aconteceu na América Latina. Sinceramente, eu duvido muito que algum dia ela venha a acontecer.
Experimente responder "não sei" para perguntas do tipo: Você acredita em Deus?, e, Qual é a sua posição política? Eu sei lá se Deus existe. Vou me preocupar (ou não) com isso, quando (se) chegar a hora apropriada. Deixe-me em paz. Sobre a minha posição política, você está mesmo interesado em ouvir? Acredito que não. A pessoa quer saber se eu sou de esquerda ou de direita, se eu sou capitalista ou comunista, se eu sou a favor ou contra o Fidel Castro, se eu sou petista ou tucano. Depois ela quer saber, numa versão bem resumida, por que eu sou isso ou aquilo. Depois acabou, cale-se, vamos falar de futebol: você é corintiano ou palmeirense?
Se hoje em dia é assim, imagine em Cuba no início dos anos 1960. Algumas situações históricas nos obrigam efetivamente a tomar partido. Em Cuba, quem era a favor da revolução ficou e aderiu, quem era contra se mandou (ou tentou se mandar). Ontem, eu e a Vivi assistimos a um filme do mesmo diretor de Morango e chocolate, o Tomás Gutiérrez Alea, chamado Memórias do subdesenvolvimento. É interessante, exatamente, porque fala de um intelectual cubano chamado Sergio que, em pleno ano de 1961 (a Revolução cubana havia começado em 1959), que resolve permanecer em Cuba sem tomar partido, levando a mesma vida que levava antes.
Sergio vê os pais, a mulher e o melhor amigo abandonarem a ilha com destino aos Estados Unidos, e diz: lá eu já conheço, aqui eu não sei como as coisas vão terminar. É interessnate, também, como o intelectual sente um incômodo profundo com o subdesenvolvimento de Cuba. Ele sempre foi uma pessoa que tentou viver à européia e, por pensar que a típica cubanita Elena lhe joga o tempo todo na cara a condição de subdesenvolvido, ele a abandona durante uma visita à casa que foi de Hemingway.
O intelectual, em um de seus discursos antiterceiromundismo, até se vale de uma metáfora geodeterminista à triste condição dos trópicos, dizendo que "aqui as coisas amadurecem e apodrecem muito rapidamente". E continua com sua vida de tempos pré-revolução, vivendo de aluguel, morando num apartamento enorme, cheio de discos, obras-de-arte e livros, e passeando pelas calles de Havana como se fora um estrangeiro.
O filme me fez pensar o óbvio: não tem como não tomar partido, não escolher um lado. Se você não escolher, o sistema força a sua escolha. É como quando nós éramos crianças e, durante as aulas de Educação Física, o professor dividia os times. "Mas eu quero ficar no outro". Sinto muito. Não pode. Alguém pode dizer que eu estou sendo ingênuo porque, na verdade, nós não escolhemos nada. Tudo bem, essa é uma outra discussão, que nós podemos deixar pra uma outra hora. Mas eu fiquei pensando, ao ver aquele intelectual no ninho de resistência ao imperialismo norte-americano a "ignorar" sua condição histórica, como é complicado (pra não dizer impossível) se livrar da ditadura ideológica a que vivemos atrelados.
Isso também me fez lembrar o livro Século das luzes, do cubano Alejo Carpentier, que acusa de uma maneira belíssima que a Revolução Francesa ainda não aconteceu na América Latina. Sinceramente, eu duvido muito que algum dia ela venha a acontecer.
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