Fragmentos da Miséria
Aí vai um pedaço do meu mais novo e solitário projeto literário:
Certa vez, em resposta ao meu velho discurso, que eu acreditava ser inovador e, por isso, gostava de repetir por aí, o Ricardo, que é muito mais escolado no mundo corporativo, me deu o seguinte depoimento:
– Você sabe quantos currículos nós recebemos? Centenas de milhares. Sabe quantos nós realmente lemos? Meia-dúzia. Sabe quantos infelizes, inclusive estagiários, nós já contratamos por causa de um currículo que veio de não sei onde? Zero. Na verdade, empresa nenhuma contrata baseada em currículos, porque você parte do princípio de que, se o cara for bom mesmo, ele chegará às suas mãos de outra maneira, indicado por outra pessoa – mais confiável que um pedaço de papel – que dirá com todas as letras: ele serve. Não adianta uma folha sulfite me dizer que o filho da puta fala dezoito línguas e tem pós-doutorado em Harvard. Eu quero que alguém me diga em português claro que ele trará rentabilidade à empresa. E os originais de um livro não passam de um currículo de candidato que o escritor de primeira viagem manda às editoras. Pior: dão muito mais trabalho para se avaliar, porque são assustadoramente extensos. No fundo, o que eu quero dizer, meu caro irmão, é que você deve analisar qual é a real necessidade que uma editora tem de conseguir novos escritores. Essa é a primeira pergunta. Será que eles estão realmente interessados em nomes completamente desconhecidos do público, que darão um puta trabalho ao departamento de marketing para competir em pé de igualdade com as aberrações de venda fácil que pipocam por aí todos os dias? Por fim, se a editora estiver realmente interessada em jovens valores, ela não selecionará através de um envelope pardo que chegou pelo correio junto com toneladas e toneladas do mais puro lixo. Existem maneiras muito mais práticas, confiáveis e garantidas de se fazer isso. Na verdade, esse departamento que avalia originais funciona mais ou menos como o departamento de reclamações de uma empresa, entende? Tem que existir, mas sua real função é mais, por assim dizer, obscura.
Depois de ouvir aquelas palavras, ditas por meu irmão empresário, eu resolvi calar a minha boca por um tempo e enchê-la com cerveja, que era mais útil.
EM TEMPO: Fica aqui registrada a reclamação do Thiago Iacocca porque eu não o incluí na lista dos que lêem este blog. Ele me mandou parar de ser viado e disse: se a pessoa não deixa comentários, não significa que ela não lê.
Certa vez, em resposta ao meu velho discurso, que eu acreditava ser inovador e, por isso, gostava de repetir por aí, o Ricardo, que é muito mais escolado no mundo corporativo, me deu o seguinte depoimento:
– Você sabe quantos currículos nós recebemos? Centenas de milhares. Sabe quantos nós realmente lemos? Meia-dúzia. Sabe quantos infelizes, inclusive estagiários, nós já contratamos por causa de um currículo que veio de não sei onde? Zero. Na verdade, empresa nenhuma contrata baseada em currículos, porque você parte do princípio de que, se o cara for bom mesmo, ele chegará às suas mãos de outra maneira, indicado por outra pessoa – mais confiável que um pedaço de papel – que dirá com todas as letras: ele serve. Não adianta uma folha sulfite me dizer que o filho da puta fala dezoito línguas e tem pós-doutorado em Harvard. Eu quero que alguém me diga em português claro que ele trará rentabilidade à empresa. E os originais de um livro não passam de um currículo de candidato que o escritor de primeira viagem manda às editoras. Pior: dão muito mais trabalho para se avaliar, porque são assustadoramente extensos. No fundo, o que eu quero dizer, meu caro irmão, é que você deve analisar qual é a real necessidade que uma editora tem de conseguir novos escritores. Essa é a primeira pergunta. Será que eles estão realmente interessados em nomes completamente desconhecidos do público, que darão um puta trabalho ao departamento de marketing para competir em pé de igualdade com as aberrações de venda fácil que pipocam por aí todos os dias? Por fim, se a editora estiver realmente interessada em jovens valores, ela não selecionará através de um envelope pardo que chegou pelo correio junto com toneladas e toneladas do mais puro lixo. Existem maneiras muito mais práticas, confiáveis e garantidas de se fazer isso. Na verdade, esse departamento que avalia originais funciona mais ou menos como o departamento de reclamações de uma empresa, entende? Tem que existir, mas sua real função é mais, por assim dizer, obscura.
Depois de ouvir aquelas palavras, ditas por meu irmão empresário, eu resolvi calar a minha boca por um tempo e enchê-la com cerveja, que era mais útil.
EM TEMPO: Fica aqui registrada a reclamação do Thiago Iacocca porque eu não o incluí na lista dos que lêem este blog. Ele me mandou parar de ser viado e disse: se a pessoa não deixa comentários, não significa que ela não lê.
1 Comments:
Faço das palavras do Thiago as minhas, leio diariamente este blog, mas nem sempre deixo comentários apesar de quase sempre gostar do que vc escreve.
Abraços mermão.
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